“Tenho-me esforçado por não rir das ações humanas, por não deplorá-las nem odiá-las, mas por compreendê-las.”
Bento de Espinosa. Filosofo

"rapadura é doce mas, no entanto, não é soft and crispy"

Francisco Bruza Espinosa , Desbravador da Bahia
"Olá Leitores, Muitissimo Boa Noite, Tarde ou Manhã. Vamos dar inicio a nosso teatro de palavras, Motivados pelo nada e patrocinados pelo tudo, inclusive por sua Tia."

Tenham um bom voo

Lucas Et Cetera Proa


Magalomania é um transtorno psicológico no qual o doente tem ilusões de ser Sidney Magal, em carne e osso!

sábado, 31 de outubro de 2009

Alice no Pais do lixo

Foi assim. Tinha uma colina, coberta de folhas secas, e o sol das 6 da tarde dava brilho alaranjado a paisagem. No topo da montanhazinha tinha um casebre de madeira violeta, feito com têcnica simples, e tinha uma chaminé esfumaçante. Alice dormia serena ali dentro, abraçada ao seu ursinho Tolunio. Um flamingo vermelho e de penugem áspera, dormia aconchegantemente sobre a cabeça da menina. Uma leve brisa da tarde passa por Alice e lhe roça o nariz, a fazendo espirar. O flamingo acorda assustado e se levanta da cabeça da menina. Ao se verem o flamingo encabulado faz olhar piedoso para Alice tenta se explicar:

-Mile desculpas, senhorita Alice e seu urso Tolúnio, estava andando anoite por essa colina e ao ver sua linda casinha resolvi parar para dormir. E como sua cabeçola, cheia de cabelinhos enroladinho, parecia bem quentinha e confortável, eu cochilei um pouco sobre ela.-

Alice compreendeu, ainda que meio desconfiada, o mal entendido, apesar de não ter gostado que o pássaro a chamasse de cabeçuda, pois ela achava que cabeçuda e cabeçola fossem sinônimos. Mas a menina não estranhou de ver um flamingo falante, e na verdade ela chegou a entranhar por não ter estranhado aquilo. Sem muito pensar convidou-o para brincar no campado do vale laranja, junto com seu ursinho. Animado o bicho, balançando a cabeça, concordou, e até achou interessante pois era hora do café da manhã e ali no vale laranja a diversão era achar as mexericas escondidas em sacos pretos. Na descida do morro eles iam observando o sol, que sorria um sorriso abóbora e aquecia com seu raios cósmicos as almas de todos moradores da colina. Alice olhava admiradamente a aura do espírito do flamingo e via nela coisas que eram comum aos dois, os borrões negros de tristeza e sujeira que davam o tom e um timbre a alma deles. A garota pensou que aquilo faria deles amigos, mas ela não sabia que a igualdade na maldade não aproxima ninguém. Iludida com a visão astral a menina percebeu que o flamingo se esticava com seu longo alranjado pescoço para tentar leh roubar seu urso. Ela bem que tentou impedir que o longo bico do pássaro pegasse seu bichinho de pelúcia, no entanto seus braços fraquinhos não foram suficientes para conter aqueles borrões de maldade que queimavam no peito dos dois. Na briga de puxa-urso-pra-cá-e-puxa-urso-pra-lá os dois tropeçaram e rolaram todo a colina fazendo com que se sujassem com o líquido amarronzado que escorria do solo. Vendo isso alguns ratos cinzas de narizes gordos e piscantes, como sirenes, que rondavam pela região em busca de sujeira resolveram se aproveitar da discórdia e da confusão entre o flamingo e Alice para levarem com eles o ursinho Tolúnio que por causa da briga estava em frangalhos, um olho de plástico o faltava e parte do seu enchimento de espuma fofinha saia por um buraco em sua pele de pelúcia.

Enquanto a menina estrangulava o pescoço do flamingo, observava seu reflexo raivoso pela íris amarela dos olhos desesperados do pássaro, e ali via sua loucura. E era como se passase por ela flashes de luzes douradas em alta velocidade, como no meio de uma avenida. Ela só podia sentir quem ela era naquela momento, e não conseguia ver a sua imagem no passado. Um espelho amarelo de moldura roxa e vermelha, assim era os olhos do flamingo sufocado que estava proximo a morte. Sua memória era parcial, mas quando se lembrou de seu ursinho e viu que lhe haviam roubado, percebeu que o mundo real crescia gradativamente e parte do sonho parecia pesadelo por causa disso. Percebeu que o pássaro que morria em seus braços era um urubu que lutava com ela por comida, e não um flamingo ladrão de ursinhos. A lágrima foi inevitável e o desespero foi desejável, e foi por isso que começou a chover e a trovejar relampagos amarelos. Chovia mas fazia sol, fazendo com que os raios da tempestade se confundissem com os raios do sol. Ao cair da água chuva o urubu que antes era vermelho começou a perder a cor escarlate, que era dada pelo sangue da carniça que estava coagulado sobre seu pêlo, até que ficasse completamente preto. Molhado e sem fôlego de vida o Flamingo-urubu tentou se redimir da vida de mentiras e carniça e falou em forma de confissão a última e epifânica frase à Alice. “Sapateiro Maluco! os ratos levaram seu urso para ele. Os ratos tem o esquema monstruoso”. A menina que chorava prestou atenção na frase e se arrependeu de ter matado o Urubu-flamingo que dividia com ela a mesma maldade da vida e a mesma simpatia pela epifania da morte, motivada pela redenção. Ao leitor sóbrio, o autor se faz entender e tenta, pois é possível que não consiga, explicar a loucura do conto de Alice. A garota chorava sobre o peito do urubu que lhe tentou tirar a vida, mas que por fim foi morto, assim como um condenado que mata o carrasco, Alice matou o urubu e se arrependeu, não só por ter esquecido de Tolúnio, mas também por ter matado aquele que era parte do que ela também era, uma faminta comedora de carniça, além de uma criança sonhadora. E isso tudo aconteceu debaixo de uma chuva dourada e de um sol relampejante de maneira que as gotículas de água formavam um complexo de prismas onde todo raio de luz refletia formando um arco-iris e onde os relâmpagos refletiam formando fractais de luz negra.

Visto isso, continuo a historia. Alice se levanta, suja de liquido marrom, de sangue de carniça e de perfume de flores do campo e mundo torna em tons de verde, uma vez que as nuvens que faziam chover agora estavam cobertas por folhas e bromélias. Ela estava determinada a fazer vingar o suspiro de seu amigo urubu-flamingo, e a achar seu Tolúnio. Mas andando pelo vale conseguiu apenas encontrar o olhinho de plástico que Tolunio perdeu em no meio da briga. Então como em toda história sobre loucura, ela, a loucura, dá as caras e o indeterminado, o imprevisível, acontece. Alice num ato de saudades coloca o olhinho de Tolunio sobre seus olhos. Seus olhos verdes de menina rica travaram e sua visão duplicou de maneira que em cada olho ela tinha uma visão do mundo. Uma Azulada, e outra Amarelada. A azulada era a visão dos olhos de Alice, e a Amarelada era o que o seu ursinho Tolúnio estava enxergando. A azulada era a visão do arco-íris , e a Amarelada era os reflexos da luz negra.

Agora você leitor se detenha nesse ponto e pense comigo como é difícil imaginar as coisas desse mundo de Alice. Olhar com olhos brancos ao mundo multicolor de Alice é como um rei sentado em seu trono ( de sanidade ) observando a estupidez de um bobo-da-corte que não compreendendo a piada, não ri. Mas, por outro lado, para o bobo-da-corte de olhos coloridos, que vive do doce devaneio, o lindo trono de sanidade parece uma terrível prisão, e por isso vive louco e rindo.

O olho era Azul. Um morro de destroços, misturado com restos e com dejetos, junto com um tanto de rejeitos e rejeitados. Ela era um rejeito pois os olhinhos azuis de menina rica contrastavam com a pele marrom de moradora de rua. O nariz coçava e a ansiedade subia como a maré de um mar azul,e alias, antes que o narrador se esqueça, de azul, também subia o nível da água. A chuva era forte e por ali sempre que tinha um temporal, tinha também uma enchente. Mas esse azul não era triste, e na chuva Alice brincava de barquinho de papel. Mas no meio da chuva o ursinho aparece, grande e forte, e tem olhos amarelos. Ela pergunta onde ele está, ela diz que está com saudades, conta sobre seu nariz que coça.
-A avenida das luzes neon. O doce do anil te levará a próxima escala harmônica, e só lá você encontrará o sapateiro maluco. - Disse acenando com o braço.

O olho era amarelo. Um Vale de felicidades. Que definição vaga, não? Explico: Arvores de algodão doce e flores de pirulitos. Ali era quente, e sempre tinha alguem sendo abraçado. Ali você, como o urso, se sentiria amado. Se alguem tivesse uma alma grande poderia inventar qualquer coisa que viraria realidade. Alice inventou que tinha mãe, e que tinha casa. E ali no meio do vale existia aquela mesma casinha roxa, e ali dentro sua mãe fazia o almoço. Muito arroz e feijão. Alice inventou que em cada almoço deveria se comer três pratos, senão era falta de educação. Então o ursinho vê Alice descendo correndo a campina. O ursinho logo imaginou que ela tinha ido para o outro lado, e ele estava certo. A menina descia desesperada, mas por mais que ela corresse não tinha força para imaginar, e por isso nunca chegava ao fim da colina.
-Tolunio eu preciso de você, eu não agüento mais ficar aqui, meu nariz está coçando e minha barriga está vazia.
Então o ursinho grita para a menina, ele se sente culpado em falar aquilo, mas era assim que ela poderia voltar. Venha pela estrada de NEON. Entre na ESCALA HARMONICA DO GRITO.


Ela abre os olhos, e eu estou vendo ela. Nós andamos juntos até aquela avenida, eu ia atrás observando. Você já andou por essas avenidas, você já viu Alice e ela já olhou para você. O céu estava anil estrelado e tinha doce perfume de jasmim no ar. Um perfume barato que vinha de Alice. As luzes passavam rápidas, mas uma delas desacelera, parando próximo a Alice. De dentro dela sai um monstro. Ela tentou fujir, mas ele à segurou delicadamente pelo seu braço, e falou com voz fina. “Você não precisa ter medo, veja eu sou apenas um coitado que nem sequer tenho coração.” A menina parou tentando descobrir se lhe falava a verdade, e realmente o monstro tinha um buraco em seu coração. Um grande vazio. Ele era gordo e grande mas falava com voz de criança. Não sei porque mas aquele monstro demonstrava no olhar e na mão boba uma enorme generosidade. “Menina vejo em seus olhos azuis-esverdeados a inocência que só aqueles que ainda tem um grande coração pode ter, mas não pedirei a sua inocência e sim apenas um pedaço do seu coração para que complete o vazio de meu”. E então eu não sei o que aconteceu, sei apenas que a menina sentiu medo de dar seu coração, mas quando viu que o monstro poderia lhe dar um doce de anil ficou mais calma e chegou a gostar da companhia e da bondade do monstro. Fazia tempo que ninguém a abraçava. Ele fez a menina GRITAR. Seja por grito de dor, ou de pavor, ou de amor, ela tinha que gritar pois sem grito não se pode tirar um pedaço do coração, sem o grito não se atinge a escala harmônica superior. Eu ouvi o grito pois estava no quarto ao lado.

Ah! ( suspiro)

Eu olho pela janela, e o estacionamento está cheio de flores violetas caída das arvores. É um noite escura, que de tão azul, o céu de luar parece roxo. Com meus olhos por entre as persianas eu vejo ela sair do quarto. Ela ainda esta inocente. Ela é uma criança e para as crianças o mundo é mágico, seja como for. O gordo de terno ainda está no quarto. Alguns minutos depois vejo um gordo de terno sair do quarto. Seu rosto é vazio, e seu coração é o buraco que ele tenta preencher. Ele entra no carro, e acerta uma comissão extra com alguns ratos que ficavam por ali.

Os olhos verdadeiros da infância não diferenciam autorama, de sabugo. Nem sonho, de realidade. Ela sai e atravessa a rua, a arvore de ipé roxo é grande o suficiente para que chova pétalas sobre Alice enquanto ela troca o doce de anil pelo seu ursinho em uma sapataria maluca. Alice no começo achou que não fosse o Tolunio, mas quando sentiu o cheirinho do seu amigo teve certeza. Eu tenho certeza que ela agora está no campado, na campina, na sua casinha. Aposto que Tolunio ficou muito feliz quando a viu de novo, eles brincaram de ciranda e voar. Ele convidou ela para que nunca mais o deixa-se. Ela prometeu. Para Alice a vida é viver e não existe inveja nisso, ela é o mais feliz que poderia ser, pois vive dentro de seus sonhos, e ela como mais ninguém de nós, sabe criar mundos fantasiosos. Ela precisa deles, precisa de Tolunio. O mundo real pra ela é um mero pesadelo que de tão forçado e exagerado chega a ser bobo. Sim, Alice vive e é feliz.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Cláu, o palhaço.

Ele sabia.

Foi o que viu nos olhos do garoto..

Foi o que viu no sorriso do palhaço.


-Na frente vai o dono, um russo mal humorado. Depois o picadeiro desmontado, kilos de lona colorida. dai vem os animais, vem a mulher barbada, vem o carro dos anões. E os malabarista vem em um vagão exclusivo. O que não significa muito luxo, 15 polonêses dormem ali. Expremer talvez fosse a expressão correta. E nesse vagão final ficamos eu e o mágico. Dividimos esse vagão dormitório. O que já deu muita confusão. Quantas vezes acordei com um coelho em cima de mim. E as Pombas que adoram durmir dentro dos meus sapatos. -


Ali estava o palhaço Cláu. o Famoso palhaço do circo Dudinka. Sentado na penteadeira do camarim retirando a maquiagem, branca e vermelha, com um pano úmido, molhando o na cumbuca com água e passando sobre o rosto. Então passava de volta na água, turvando-a de cor-de-rosa. No cabideiro estava pendurado a peruca e o colarinho largo. Seu cabelo estava duro e oleoso, como só um artista de massas consegue ficar. Um garoto de uns 14 anos estava atrás dele sentado numa banqueta, olhando com olhos de milagre para seu ídolo. Ouvindo atentamente as histórias do palhaço. O garoto saiu correndo para o camarim logo que o espetáculo terminou.


O garoto estava louco para ver o palhaço. O palhaço estava com saudades do garoto.


Todo ano que o circo passava por ali, ali estaria o garoto.

Teve um ano que o circo não apareceu. E o garoto fez a mãe lhe levar a capital só para ver o palhaço.


-A vida no circo não é engraçada. Aqui parece que está todo mundo rindo. O mundo ri. A lua é sorridente. Em noites de calor os bichinhos de luz ao redor da lâmpada parecem estonteantes de felicidade. O palhaço tem que fazer todos rirem. Mas quando todo mundo ri parece que o sorriso é sempre igual. Um sorriso cinza de obrigação, ele é forçado. A vida te força a viver. E pra viver eu forço o sorriso. O riso não deve vir empacotado, o riso é espontâneo. O verdadeiro riso acontece nas vidas das pessoas, não no circo. Mas muitas pessoas desaprenderam a rir.


Garoto, você é meu fã número 1,sabia?!


Alegria vem, alegria vai. O palhaço vê pelo espelho o garoto. Olhava os traços do rosto e sentia saudades dos dias que ele não estava por perto. Talvez pensasse em como seria a vida se não fosse assim. Jogado pelo mundo, o palhaço encontrava uma nova vida em cada cidade. Mas essa cidade era especial. Por isso mesmo ele nem gostava de ir ali.


Um amor jogado no meio dessa vida de risadas. O amor passa pelas vidas. Há de passar. Pois passou para o palhaço. Passou. Foram as poucas semanas que ficou naquela cidade à uns 15 anos atrás. Um pequeno conto no meio de um romance de estrada.


Quer um nariz de palhaço? Pode ficar! - disse se virando para o garoto.


-Você é meu filho. Desculpa por não ter te visto crescer. - O palhaço pensou em falar isso.


E não falou.


As vezes, mas só as vezes ele para pra pensar como seria se não assim. Nessas horas ele ri para não chorar. Mentira. Ele chora. Mas só as vezes. A vida sem compromissos, sem rumos, sem seguranças, sem lar, é boa. Muito boa alias, nunca se tem rotina, nem chatices da vida. Só não é boa quando você para pra pensar.


Uma garota linda o olhava da platéia, e ele ainda tinha o sorriso da alegria. Durante todo o espetáculo ela não tirou os olhos dele. Ele fazia cambalhotas, e tacava tortas, pomposo, pois sabia que aquela garota estava olhando só para ele. Ele olhava as vezes para platéia, mas só olhava para ela. Não vou dizer que isso nunca lhe havia acontecido, as pessoas do palco sente sempre isso, essa troca de olhares e de sensações. Mas sempre é novo e incrível. É Incrível como todas as outras pessoas desaparecem nesse momento. E o show vira uma apresentação para uma só espectadora. Quando ele chegou ao camarim lá já estava ela.


- Você foi mais rápida que eu. Estava com saudades né?


Ela só o olhou com aquele olhar de adolescente e o puxou pelo braço. O palhaço resistiu ao puxão, porque queria ser puxado. - Aprenda isso, só é puxado aquele que tenta ficar parado- O mundo é muito mais simples nessas horas. Eram os dois ali, o palhaço e a garota da cidade do interior, vivendo suas paixões irreais. As paixões irreais são muito mais importantes na vida de uma mulher que as reais.


Deve ser porque depois que tudo acaba, elas podem se perguntar:


Como seria se não fosse assim?


Naquela noite as risadas não podiam ser contidas, por isso pareciam gargalhadas. Sabe, a paixão é como uma gargalhada, pois é o amor em sua forma incontrolável. Naquela semana ela venho em todas os as apresentações. E foi ao camarim depois de todas elas.


E ele nunca se sentiu tão engraçado, nas graças daquela garota suas falas eram piadas e seus risos eram suspiros. Se engraçavam por toda a noite, e a luz do sol o acordava na cama suada do seu camarim e ela já não estava ali. E durante toda a tarde ele esperava que chegasse a noite. Esperava que o show começasse, pois ali no show o amor também começava.


Mas a vida se reinventa e o palhaço se foi com a comitiva. E teve outros amores. E viveu outras histórias. E a garota que ficou, ficou com saudades mas nem sequer sabia onde o palhaço foi. E foram um mês... e dois. E foram três meses. E a barriga venho. E nas cidades de interior mãe solteira é vagabunda, então se casou com o garoto que era apaixonado por ela.


-Eu estava na maternidade quando você nasceu. Sua mãe me mandou uma carta, eu fingi nunca ter recebido. A gente escolhe um jeito de viver. E queria viver esse amor, mas a comitiva segue e a gente tem que ir.- O palhaço queria se explicar ao garoto, mas achou melhor não.


Ele recebeu a carta que ela falava sobre amor e sobre família. O palhaço pegou um ônibus pra ver seu filho nascer, e chegando na cidadezinha do interior viu uma placa dizendo:


Bem-Vindo a BELO RISO.


Quando chegou no hospital olhou para todos aqueles bebés na maternidade. Sentiu o medo, o verdadeiro medo que é aquele que só quando se quer amar se sente. O medo de amar. - Entenda que no fundo todos os medos vem do amor.- E ele resolveu ir embora, porque só assim o garoto teria um pai de verdade. Um pai presente e não um palhaço qualquer. E pegou o ônibus de volta, e saindo da cidadezinha viu pela janela uma placa pichada que dizia:


Volte sempre com seu AMARELO RISO.


- No circo, garoto, todos torcem contra os equilibristas. As pessoas querem o pior, isso faz elas se sentirem melhores.-


O palhaço Cláu sabia que aquele não era seu filho, e por isso não falou nada. Mas sempre que estava de volta a RISO ele gostava de imaginar como estaria o seu garoto. No fundo ele esperava que o garoto nunca descobrisse que era filho de um palhaço, pois só assim o riso do menino poderia ser verdadeiro. Pois a verdade esta no amor, assim como o sorriso. É por isso que o palhaço sorria sem verdade.


Era tarde e o garoto foi embora.

E quando saia estava usando o nariz do palhaço.

E sorriu com verdade.

Então ele viu que o garoto sabia.


Então o palhaço pensou. Como seria?

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O Roubo da Rosa

Madeira compensada coberta por fórmica rosa, uma escrivaninha. Sobre ela uma folha de sulfite desenhada a traços infantis com giz de cera colorido, ao lado uma caixa de lápis cheia, todos com ponta quebrada. A Magnum de cano longo, com 3 balas no tambor e uma na agulha, brilhava. A luminária dava parcial tom de amarelo ao quarto escuro. Ele estava sentado, olhando ora para o desenho, ora para a arma. Pensando na morte, dele ou dela ou de sí. Estavam faltando duas balas e a arma estava engatilhada, ele achou que talvez fosse a hora.
Após um berro de angustia, lança o copo de Johnny-on-the-Rocks contra a parede. Na trajetória parte da bebida escapa do copo e vem de encontro ao seu olho. Os estilhaços do vidro caem sobre o carpete, e a bebida escorre pelo papel de parede com motivos de ursinhos. Como num teste psicotécnico, ele enxerga no borrão de álcool dourado a imagem de um coração despedaçado.
Quando não se sabe o que é futuro e o que é passado tudo fica presente. Podia sentir a cena acontecendo novamente. Um filme mental, de Sara tomando um tiro. Foi sem querer, eu juro. Perdoe-me filha, Papai te ama. Papai te ama muito. A cena acontecia de novo ou ainda viria a acontecer?

Ele sou eu, e eu não sei quem sou. Isso foi ontem, hoje eu estou empunhando a arma, dirigindo meu carro indo para casa de Ana. Ana é a mãe de Sara. O ponteiro está marcando mais de 150 e eu vejo vultos de postes de luz passando em forma de reflexos sobre o parabrisas. Com uma mão seguro o volante e com outra uso a ponta da Magnum para mudar as estações de rádio. Soul-music dos anos 60, Aretha Franklin sussurra gritos que acalmam a alma dele. São duas da madrugada e os semáforos vermelhos agora parecem como sugestões. Pare ou será tarde. Manter linha reta era difícil, mas por outro lado fazer curvas derrapando era prazeroso.

-Ana, eu te amo.
-Você não pode me largar assim.
-Eu vou me tratar.
- Isso é só uma fase.
-Você não vai ficar com Sara.
-Minha filha é tudo que eu tenho.
-Te pago o quanto você quiser.

Foi o que disse quando a mulher foi embora de casa, levando sua filha. Minha Filha.

O roubo da Rosa. Não há pecado em retirar uma flor de um jardim. Mas até que ponto a beleza do vermelho delicado, vale os cortes do espinho? Se bem que no fundo tudo é vermelho: a pétala, o sangue, o coração.

As luzes de minha casa estão acesas e eu acabo de chegar do trabalho, estou cansado e quero tomar um whiskey para relaxar. Abro a porta e parece que entro dentro do inferno, Ana vem pra cima de mim gritando. O que os vizinhos vão pensar disso? Eu fecho a porta e tento fugir dos tapas dela. Permaneço quieto e vou de encontro ao destilado, ela está me perseguindo e me batendo. Ana não é real. Porque isso foi ontem. ou vai ser amanhã? Ainda consigo lembrar dos escândalos de Ana e de tudo que a coitadinha da minha princesa era obrigada a ouvir. Os gritos não são de Ana, são meus.

Hoje Ana é casada com um Alcoólatra. Outro alcoólatra, as vezes parecem que as mulheres gostam de insistir no mesmo erro. Só posso ver minha filha nos finais de semana, e hoje é sábado. A mãe dela acabou de chegar pra deixar a menina comigo. Hoje eu e Sara vamos ao parque e vamos tomar sorvete e vamos assistir Bob Esponja juntos. Faz dois anos que eu e Ana nos separamos por incompatibilidades de genes, eu bebia destilados e ela apenas água, para fazer o Vallium descer pela garganta. Eu parei de beber desde então para convencer o juiz a me dar a guarda da Flor. É mentira eu tenho um cantil escondido sob o banco de passagueiros.

Minha rosa tem 8 anos, e não quer que eu de banho nela hoje. Semana passada ela ainda deixava, eu me lembro, eu enchia a banheira e colocava alguns brinquedos para ela, fazia espumar e brincávamos de guerrinha de agua. Ela não acreditou quando eu comprei uma arma. Uma arminha de água para ela e uma para mim. Disse assim

- Agora, Flor, você subirá de patente nessa guerra. Será chamada Capitã Flores e como prêmio receberá sua primeira arma.

Vocês adorariam ter visto o sorriso dela. Ela não acreditou quando me viu com a arma na mão, essa não era a de água. Ela até sorriu no começo, mas quando percebeu que eu gritava com o seu padrasto ela aprendeu que aquela não era uma arma de brincadeirinha.

Depois do parque ela foi tomar banho e não quis brincadeira com água. Disse que já era menina crescidinha e não queria que eu à visse tomando banho. Eu concordei, ela realmente estava ficando grandinha. Na realidade ela ainda era um bebê para mim. Eu lembro dela pequenininha, um botão de rosa, linda demais dos olhos amarelos e do cabelo preto, bem preto. Eu fui meio que a contra-gosto, assistir Tv. Então me lembrei que não tinha toalha para ela se secar. Seria minha desculpa para poder ir até o banheiro, peguei a toalha da Minnie e senti o cheirinho de minha filha.

Guardo até hoje essa toalha, nunca mais a lavei. Mesmo assim, cada dia menos lembro do perfume da rosa.

Eram duas da manhã, e ele estava acordado conversando com Ana. Eles discutiam, sobre Sara. Ele não era eu, até mas parecia. Estava bebado, mas tomava vinho, eu nunca tomo vinho. Só Johnny. Red, vermelho como a rosa. Eu entro na casa e ali não parecia o inferno, era o céu. O céu de Sara. Dei um soco na cara dele, na foto com a cara dele, pendurada na parede como um quadro da família perfeita. A Arma na cintura apertava minha virilha.

-Filho da puta

Ela acordou e me viu com a arma. Era o céu.

Entrei no banho para levar a toalha, e a água era vermelha. Porque você não me contou isso? Ele disse que te matava, te ameaçou. Filho da puta. Nesse dia eu tive medo de deixar Ana pegar minha filha, domingo anoite ela vinha comprir o mandato do juiz. Aquele padrasto sujo era amigo do juiz. Na hora que soltei sua mão para deixa-la ir com a mãe, eu vi seu sorriso amarelo. Pensei se era um sorriso de medo. Mas não sei se o medo era meu ou dela.

Quando você para pra pensar! É melhor deixar ir, hoje, para poder ir, amanhã. Eu deixei ela voltar com Ana para poder comprar a arma, e atirar e matar. Premeditado. Tem um ditado que diz

-A vida é curta.

Eu dei o tiro no Filho-da-puta. Acordar de ressaca no outro dia é a dor que eu quero sentir para poder esconder-me nela. Você não sabe mais quem é você, tudo que a culpa faz é te trazer para o passado. Ontem eu matei. Ele matou, e quem é ele, eu sempre me esqueço. Eu.

Eu xingava ele, estuprador, e Ana gritava. Ela sabe? Não queria que Ana soubesse, eu não queria saber. Sabe como é duro você ter que fazer cara de atencioso com sua filha para que ela conte pra você que foi estrupada. Ela não sabia nem o que era aquilo.

Disparei duas vezes, mas a segunda bala voou da minha mão de aço inoxidável reluzente e um anjo com mãos delicadas conduziu-a à testa da princesa do meu castelo. Ela começou a cair lentamente, escorregando sobre os braços de um querubim. Ele a abraçou e falou para ela algumas palavra no ouvido da criança. A língua dos anjos. Suas asas rasgaram o terno branco e ele a levou.

A rosa ao chegar do outono perde as pétalas. Todas as pétalas voam quando começa a brisa do inverno.

Estava ali mais próximo do céu. As crianças tem lugar garantido sobre as nuvens. Um paraíso de doces onde toda casa tem um parquinho. Eu contava isso quando lhe colocava para dormir. Deus leva primeiro as crianças despedaçadas. Ele também se sente culpado como eu me sinto. Ele colocou ela nessa terra, arrependido de não te-la guardado, segura de tudo. Brincaria com ela todos os dias da eternidade.

No fundo mesmo, eu sei que estou aqui diante do tribunal. Acusado do assassinato, perante o Juiz fazendo a minha defesa. Mas eu não tenho defesa. A insanidade foi a única saída, vocês não querem saber como é matar a própria filha. Eu olhava para os jurados. Alguns dos jurados choravam. Eles me entendiam.

Eu estou na escrivaninha de fórmica rosa e queria sair dali. Os corpos mortos na sala e eu estou sentado no quarto de Sara. Tinha que encontrar minha filha de novo. As luzes da sirene da viatura passavam pela a janela iluminando o papel de parede de cores azul e vermelha. Eu estava com a arma na cabeça. Eu tentei apertar o gatilho. Mas eu tive medo. Merecia penar mais um pouco nessa terra. Era justo assim. Minha arma emperrou. E outra arma se encostou na minha nuca. Parado.

Eu matei o padrasto, um tiro direto no peito dele, e errei o segundo tiro aquele acertou Sara. Eu olho para o Juiz faço uma arma com a mão, miro na testa dele e dou um tiro de mentirinha. Pum! Pum! Faço as onomatopéias cuspindo na cara do Juiz, amigo do padrasto. Foi naquela casa que nos trés morremos. A rosa, o louco e a serpente. Mas Deus tem um lugar no céus para os loucos. Foram os únicos que realmente entenderam o mundo.

Estou na minha escrivaninha. Isso vai acontecer? Ou já aconteceu? Olho para a Magnum. Tem 6 balas no tambor.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Alter-ego da Solidão.

Ei, cachorro, venha aqui! Esta chorando?


Pequeno e maltrapilho cão de que vale a lágrima? Chorar por ai não vai adiantar. Atrasar também não vai. A gota de água salgada, rola e seca sobre seu pêlo marrom, e o mundo continua o mesmo, girando sobre seu eixo na mesma velocidade. 24 horas é o tempo de uma volta, e chorar só muda uma coisa. 1440 minutos de angustia, ou, contados, 86400 segundos de alegria. Oh, pobre canino não fique por essas calçadas imundas desse submundo a vagar. Sente se aqui, sobre o papelão sujo, e fale-me da sua vida de cão.


És um belo cão, não há porquê em lastimar da sorte.

Entendo que teve uma vida sofrida. Todos te chutaram, te difamaram, o chamando de sarnento, e te humilhando jogaram o pão cagado pelo diabo . Hoje, se vê um homem levantar a mão saí correndo, temendo um esporro ou uma pedrada. Não é por menos. Mas um dia você teve família! É mesmo, um dia você teve família, um lar-doce-casinha-de-cachorro. Pais e irmãos lhe davam atenção e afago. Tinha comida e abrigo. Pense a saudade também é um sentimento desejável, pois, no fundo, mede a beleza do passado. Que história interessante, canino,conte-me mais para que eu posso lembrar também da minha própria história. Faz tanto tempo, que nem das agonias da vida eu lembro. Eu não tenho saudades. Ou tenho?


Quer saber sobre mim?

Te conto, te contarei minha vida, das partes que eu assim lembrar, mas antes você deve saber que minha memória é mendicante, assim os relatos podem ser alterados dos verdadeiros. Que seja, contarei como puder e falarei das partes que me coração lembrar! Só te conto para lhe mostrar que não se deve chorar e sim rir, ainda que não se tenha mais dentes para isso. Eu tive família, esposa, não tive filhos porque não quis colocar mais rebentos nesse mundão de ninguém. Fui feliz, sou feliz. O cachorro ambulante que não abana mais o rabo, vivendo de lamurias, eu também teria todos os motivos para chorar. Mas não choro, meu estilo de vida não permite. Não me diga que eu sou um excluído da sociedade, pois assim estaria cometendo injustiça. Eu sou a nata da sociedade.

Como eu assim sujo e largado na rua posso ser a nata da sociedade? Te explico. Você que esta triste , por isso agora talvez você discorde do que te falo, mas se te falo é com toda a sabedoria que só a rua dá aqueles a quem acolhe. A rua me acolheu e me ensinou, e assim devia você também aprender com ela. Em que consiste a vida, hein cachorro em que consiste essa pedaço de luz passageiro? Te digo a vida consiste em viver, e nada mais, pois vivo por isso me alegro. Eu me exclui da sociedade, eu disse não as oportunidades que me deram. Eu escolhi ser mendigo quando minha mulher me chutou de casa, eu, quis, no fundo, que ela me largasse na amargura. Amargura não. E sim, plenitude de viver.


Posso te fazer um carinho?

Vou esfregar sua barriga e talvez você sinta-se mais calmo, e pare de chorar.

Viu?

Sente se melhor?


É assim.

Um dia o homem fui um macaco, que vivia livre pulando de cipó em cipó. Fui ai que o mais espertos dos macacos convenceu os outros a seguirem suas ordens, dessa maneira, os macacos estúpidos poderiam achar comida mais fácil e caçar com mais destreza, usando apenas as orientações do macaco sábio. Para isso o macaco inteligente pedia um pequeno pedaço do arrecadado, e vivia sem trabalhar. Seu trabalho era pensar. Só assim que o homem evoluiu, tutelado pelo macaco sábio. Pois bem, isso foi perdurando durante toda a existência do ser racional humano. Como eu sei tantas palavras? Sim, canino, eu sou estudado. Lhe disse, sou mendigo de opção, e por opção também converso com cachorros de rua como você.

Imagina o que pensariam de mim se me vissem falando com um cachorro?


Eu acredito que todos os homens podem ouvir os animais, temos uma língua comum, o coração, mas há aqueles que não o escutam porque só foram ensinados a ouvir o macaco sábio. Não aprenderam a pensar sozinhos. Agora eis o paradoxo. Eu sou o macaco sábio, vivo sem trabalhar e penso por mim mesmo. Eu como dos restos da sociedade, e por isso eles tentam me excluir, antes disso eu mesmo me exclui.


Cachorro entenda que nada faz sentido.

Não vale o seu choro, o desprezo, porque o desprezo nada mais é do que o aval para seguir seus próprios passos. Seguir o coração. Nossa mente busca causalidade, busca achar o sentido para tudo, mas lhe adianto que não existe sentido na causalidade. Pois veja, o que venho antes do mundo? Alguma coisa diferente, de certo! E antes disso? Outra ainda mais escabrosa. Então, em algum ponto, concorde comigo, não mais poderá se determinar o começo, pois o começo pode ser até mesmo o próprio fim. Se assim, como uma roda gigante galáctica, pode haver algum sentido causal nisso? Não.


Veja que o macaco esperto, aprendeu a inteligencia, e é essa a mesma inteligencia que temos hoje, de serventia, apenas, para controlar os estúpidos. Por isso nossa racionalidade só presta ao mascaramento, a engabelação.


Sua mão te largou, pois você foi um cachorro fujão e desobediente, mas ser fujão e desobediente não é na verdade ser cachorro?


Você é meu alter-ego.

Cachorro, você chora por aquilo que eu gostaria de chorar, não choro porque se chorasse nunca conseguiria ser mendigo. Se me culpasse provavelmente não poderia sequer viver. Mas você guarda dentro do seu peito peludo todas minhas angustias. O que me faz pensar, seria você o próprio cão, o Capeta, a me tentar. Querendo me arrastar a perdição e a danação do desespero? Porque então posso conversar com um maltrapilho de um cão, como se fosse algo normal.


Sei que a rua me enlouqueceu.

Mas a loucura do louco é o convencimento de sua insanidade. E “eles” me convenceram. Sou, por certo, estúpido mas minha estupidez é a de não aceitar a estupidez do mundo.


Se vive a espera do fim,

sob prantos sem fim,

pois, sim, deves rir de mim.


Sou mendigo e converso com cachorros encarnados do Capeta.


Mas se veio aqui para me tentar o Cornudo, suma já!

Tenho comigo toda a proteção divina destinada ao parvos. Sabe Gil Vicente? Só o louco entrou no céu. Nunca chamarás alguém de louco, cachorro! A santíssima bíblia sagrada condena.


Passa! Cão demoníaco, sou mendigo e não chorarei por minhas tristezas, só se é triste quando se tem ao menos comida. Os famintos não são tristes.


Passa.


(O cão afastou-se com medo do mendigo que berrava em plena avenida principal.

Achegando-se a outro morador de rua para tentar roubar um pouco de comida. Novamente o cachorro ouve o aroma alcoólico dizendo:)


- Cachorro chorão. Nuummmm Pode chorar aqui não.

Vem aqui cachorro , vou te contar minha vida.


sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Suíte Paris

A lâmina, o corte, o talho e a perfuração por ela proporcionada, foi uma das armas que possibilitaram o início da evolução do homem. - Alguns homens evoluem, outros não, e esses são homens maus.- Mal Mal Mal.- Assim, com a invenção, o homem pode dominar a natureza matando animais para comer, se defendendo das ameaças da selva e assassinando tribos rivais. Matar-morrer; Apagar-Sumiço; Assassínio-esfalecer; Mandarparaooutromundo-baterasbotas; Pau-e-Pumba. Mas só na idade média que foram escritos os primeiros manuais de corte de carnes, com o uso de facas. Verdadeiros manuais do esquartejamento e evisceração. Afiar uma faca é uma arte, não!? Parece cortar bem essa, o que você acha? Eu que afiei para você.

Ah! Não me faça esse berreiro. Não doeu tanto quando dói a dor do coração. A dor de um amor partido. Ainda assim amar vale a pena. Claro que eu te amo amor. Você foi meu primeiro namorado, eu era apaixonada por você desde pequenininha e nós brincávamos juntos, lembra que tomávamos banhos nós dois eu tinha 8 e você....-Fez uma cara de quem pensava- 10, você tinha 10 anos. Nós fomos a Nova Orleans numa viagem a trem, nos apaixonamos lá e foi tão lindo. Você é meu grande amor de infância, voltamos e nos casamos aqui. Você usava uma coleirinha e eu te dava uns tapas. Não tivemos filhos e viajamos o mundo. Conhecemos Paris. Eu adoro Paris, conquistaria aquela cidade só para poder conhecer o Louvre. Sim conquistaria. Mas não foi assim né?! O amor nos prega peças. O amor enlouquece.

Hey feeling good was good enough for me, hmm-mm
Good enough for me and Bobby McGee.

La da la la la, la da la la la da la
La da da la la la Bobby McGee yeah

Cantava a música.
O som vinha da caixa de som, chiada, de um motel de quinta categoria

Como foi de verdade, ah disso eu lembro. Não preciso nem pensar. Me casei com o esportista bonitão da faculdade, e como é bonito, se chamava Renato. Você se chama Renato. Você é meu marido, você foi com que me casei. Você é meu e não daquela vagabunda do seu escritório. Você não percebeu que eu tinha contratado um detetive para te vigiar. Ele me contou tudo, eu não quis acreditar. Fui então conferir com meus próprios olhos, lá estava você que há alguns minutos havia me ligado para falar que tinha uma reunião e ficaria trabalhando até mais tarde, lá estava você entrando nesse mesmo motel. After Dark motel: Suíte Paris, que ironia do destino, nessa mesmíssima cama.- E saiba: com esse mesmíssimo lençol, onde nele ficou além dos seus fluidos internos ficou também minhas lágrimas e agora tem, que lindo, uma gotinha de sangue sua.- eu vi você comendo aquela piranha, ela gemia como uma puta. Ela te deu trabalho, tem que ser forte para agüentar 5 fodas em 2 horas. Você está de parabéns. Depois disso você foi para casa e me deu flores, que marido dedicado. Trabalhou até mais tarde porque é um bom provedor. Isso foi ontem, há um ano, dia 14 de junho de 2008 . Hoje é dia 15 de junho de 2009. 14 foi o dia que Hitler chegou a Paris. Como eu sei isso? Tive um ano para estudar sobre ele, sou uma aluna dedicada, e aprendi, por sinal, muito bem. Tudo sobre Hitler e sobre facas. Lia o Mein Kampf enquanto você jogava pôquer com os seus amigos e se você pudesse ver pela minha íris, você veria o reflexo de você e dela transando.

Eu não chamaria aquilo de amigos. Bom pelo menos, não, se você define amizade como compromisso, como lealdade.

Ela estava em cima dele, estava sentada sobre o marido amarrado e amordaçado. Se debruçou sobre ele e passou a mão sobre seu corpo colocando sua boca próxima a orelha dele. Deu uma mordidinha. E falou sussurrando. - Dei para TODOS eles.-

Primeiro foi o Don Juan, garanhão, putanheiro, do Norberto. Ele adorava contar causos amorosos na mesa de jogo, mas não me pareceu tão experiente assim. Samba-canção, dizem que se pode fazer uma análise da personalidade pela roupa íntima do primeiro encontro. Eu diria que ele é fraco e pouco animador. Digo porque na verdade ele fez pouca coisa, só ficou parado. Eu fui um produto sexual dele. Esta curioso para saber como eu fiz ? Como eu o seduzi?

Puxou do maço um cigarro e acendeu com um Zippo que tinha uma suástica desenhada.
Deito-se ao lado do marido, ambos se olhando pelo espelho do teto.

Eu sou gostosa, sei disso, sei usar isso também. Usei isso para ter você, minha obra de arte particular. Lembra de que calcinha eu usava quando fizemos a primeira vez? Era uma lingerie furadinha toda preta, linda, e tinha um entrada de emergência.- Sorriu e se colocou em cima dele novamente- Foi fácil com Norberto. Durante algumas semanas eu freqüentei diariamente a loja de carros dele. Pedia, debruçada no balção, para poder testar alguns carros. Ele balança a cabeça afirmativamente mas os seus olhos não, seus olhos ficavam fixos em meus peitos. Canalha. Então ele quis me mostrar o carro esportivo dele. Ele deixou que eu dirigisse, e eu errava lugar do câmbio às vezes. Ele não resistiu à tentação, mas também com aquele vestido vermelho meu. Coladinho. É como eu disse, ele não fez muita coisa, ficou parado, quem fez algo foi eu. Eu dominei. Sabe que eu acho que sei porque ele tem tantas mulheres. O piupiu dele é praticamente um gavião. Sinto lhe informar mas você perde por muito.

Quer saber algo engraçado? No dia anterior a isso vocês jogaram pôquer. Por acaso você brincou com ele dizendo. Com uma mão dessa eu aposto até a minha mulher. No jogo você venceu, olha que ironia!

E o Geraldinho, esse foi mais difícil. No começo até parecia seu amigo, confesso que achei que não iria conseguir. Daí resolvi chorar as pitangas para ele, disse que eu estava carente e que queria alguem para cuidar de mim. O coitado se identificou com a história e chorou também, dizia que a esposa dele não queria mais nada com ele. Isso é preço, fiz gato e sapato com ele, porque o valor da amizade ficou muito caro para ele quando o custo de se segurar ficou alto. Ele tinha necessidades, a mulher dele não dava conta, Necessidades primárias da piramide de Maslow. A amizade não é primária, deve de ser lá para terciária, vigária e mercenária. Sabe o que isso significa? - Puxou catarro do pulmão com um som horrível, fez uma especie de bola verde pegajosa na boca e cuspiu na cara dele- Ele cuspiu na sua cara,Ele queria casar comigo. Me ligava chorando pra dizer que eu era a mulher da vida dele, que a esposa dele tratava ele mal. Coitado, cheguei a ter pena. Teria pena se ele não fosse um pilantra traiçoeiro. Está vendo esse anel? É de ouro, ele que me deu. Ele disse no meu ouvido “larga o babaca do seu marido, ele não te ama”.

O que Amar? Tantas definições para uma palavra tão pequena.-Disse passando a mão pelo corpo de Renato, deslizando-a até coloca-la dentro da calça dele. Com as unhas apertou.- Amar é sentir um aperto no coração, mas tem gente que o coração não fica ao lado esquerdo do peito. Renato, você é sujo, não vê que estou com uma faca na mão e que posso te matar. Vou te matar e ainda consegue ficar ouriçado mostrando toda a sua perversão. Hahaha! Que menino safado- abrindo o zíper- Gozo significa Alegria, sendo ele a semente da vida, o broto de gente, o germe da criação, conserva em suas gotas todas a potencialidade da arrebentação. Louco não se contraria, se satisfaz nutrindo sua insanidade- Devagar soltou a mordaça da boca dele, fazendo sinal para que ficasse quieto. Apertou a faca contra o pescoço dele e o beijou um beijo longo e quente- Aos cavalheiros aqui presentes, declamo o ode a toda tara. Eis a ironia do gozo da morte, o suspiro do fim, como um capitão do navio ao prenuncio do naufrágio, permanece em pé, honrando a sua própria devoção pelo nefasto. Se é isso que você tanto quer, você terá como um ultimo pedido do condenado.

Ele gemia e suava de prazer e de desespero. Já passava da meia noite, estava escuro. Aquela mulher parecia tão boba e ingenua, e em certa medida não atendia aos seus ensejos. Nunca contaria para ela do que ele gostava, a vida é mais complicada que o preto e o branco. As coisas são multicoloridas e polifacetadas. Ela era sua esposa, e a ela cabia ser família, ter filhos e ama-lo. A secretária era o complemento a sua mente imaginativa. Mas agora tudo se confundia, agora queria essa nova esposa. Agora não adiantava mais pensar nisso. Apenas se entregou a noite.

After Dark – Tito & Tarantula

Watching her
Strolling in the night
So white
Wondering why
It's only After Dark
In her eyes
A distant fire light
burns bright
Wondering why
It's only After Dark
I find myself in her room
Feel the fever of my doom
Falling falling
Through the floor
I'm knocking on the Devil's door
In the Dawn
I wake up to find
her gone
And a note says
Only After Dark
Burning burning
in the flame
Now I know her
secret name
You can tear her temple down
But she'll be back
and rule again
In my heart
A deep and dark
and lonely part
Wants her and
waits for After Dark



Você faz muita sujeira- Passava o lençol para limpar- Seu melhor amigo também, não que eu queria cortar esse clima gostoso pós-perversão, mas é que preciso me confessar contar tudo que eu fiz antes que de as quarto horas que eu paguei. E ainda preciso perfurar. Prossigamos, por fim ainda precisava terminar de seduzir o grupo do pôquer. Foi a uma semana o ultimo- Andava pelo quarto nua, e fazendo olhares insinuadores- Carlos seu amigo de infância. Mas a vida é engraçada, era o que mais te odiava, ele dizia que sempre me quis que eu era para ser dele. Disse que você trapaceava em tudo, desde pequeno grudava chiclete na mão para bater figurinha. Roubou figurinhas de Carlos. Ele disse que você é um merda. Sabe que foi o Carlos que veio me procurar. Ponto é a alma do negócio, disponibiliza a facilidade e as pessoas viram atrás de você. Um dia liguei do seu celular para ele e disse que estaria no motel. Isso é promoção, quem resiste a uma boa promoção- Arrumando o cabelo e passando batom, reparando na lua cheia pela janela- Carlos estava em prontidão para acabar com você. Mas eu ti amo e eu me coloquei no seu lugar, pensei, o que eu faria com um amigo que me traiu, o meu melhor amigo, com a minha mulher. Você reparou na mão dele? Ele foi jogar pôquer essa semana não foi? Pois, então, ele não te contou porque estava com a mão enfaixada? Obviamente que não. Um covarde que não tem bagos para falar “Comi a louca da sua mulher e depois ela enfiou uma faca na minha mão”. Essa faca, essa mesmíssima faca que eu enfiei por você naquele desonesto. Quando amamos chegamos ao estado de transe onde você se sente o outro. Engana-se você, se pensa, que eu me mataria pensando ser você, jamais, até porque de que valeria toda minha dedicação lendo Jack, the Ripper? Não se pode trabalhar com a faca quando se enfia em si mesmo.- Vestiu-se novamente no vestido vermelho vermelhíssimo.-

A faca dançava pela pele de Renato, Victória conduziu a faca até aos nós que o atavam a cama e os cortou.

-Nossa.
-Você me pediu a 39, não foi? 39 é o da esposa psicopata.
-Pedi sim, Digo, Nossa, porque você é boa nisso.
-Fiz Teatro.
-Está de parabéns.-Colocando a calça e procurando a carteira no bolso- Aceita cheque?
-Só dinheiro e você sabe disso, te avisei antes. Nem adianta reclamar que eu chamo o Roi.
-Não precisa falar assim, foi só uma pergunta.
-Desculpa, é que esses dias recebi um cheque sem fundo, estou puta com isso.
-Hahaha! Engraçado. Faz por 800?
-Não.
-Pó! 800 em dimdim?
-Vou chamar o Roi.
-Nossa. Toma os mil.
-Obrigada.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

O mundo amarelo de Clara vermelha.

Este não é o mundo onde você vive. Este é outro mundo. Na verdade é o mesmo, só que diferente. Aqui todas as crendices foram abolidas, por decreto da União Global das Cidades. Aqui não tem países. Nem caramelos e balas, nem chicletes. Nem governantes, apenas um conselho de sábios, escolhidos por concurso. O Concurso da página amarela, é como chamam. Uma espécie de teste de QI, feito em folhas de papel amarelo reciclado. A partir desses resultados se é encaminhado ao trabalho que mais lhe seria apto. Não existe nenhum obrigabilidade quanto à que tipo de atividade econômica que o cidadão praticará, pode se fazer o que quiser. Nada lhe impede de fazer outra coisa, mas todos os homens desse mundo são racionais, e assim racionalmente escolhem o trabalho para que são escolhidos.

Pensavam assim:
Meu salário é proporcional ao meu trabalho.
Mas se sou apto para trabalhar em A, vou me esforçar menos.
E por isso ganharei mais relativamente ao meu esforço.

Todos eram assim. Pelo menos desde que Atenas dominou o mundo, espalhando o amarelo dourado da razão. Alexandre o Grande perdeu a guerra na península Ática. Vitoriosos, os atenienses ganharam força e foram expandindo seu modo de vida. A racionalidade ganhou ares de religião, diria, o leitor, se estivesse nesse mundo, apesar de religião ter sido banida por aqui. Nesse mundo religião é algo totalmente arcaico, igualmente a prática de balonismo- Não é racional voar de balões-. Nós só acreditamos em provas. Você se assustaria se conhecesse esse mundo assim como Clara se assustava todos os dias.

Clara não conhecia o sabor de um pirulito. Clara era apaixonada pela cor vermelha e pelo arco-íris. No entanto se nós conhecêssemos o mundo de vocês não nos assustaríamos, pois é visível que todas as mazelas que vocês criaram são conseqüências do sentimentalismo infantil. Vocês são piores que a boboca da Clara. Provas devem ser provadas no branco e preto, esse papo – esse discurso infundamentado- de seguir a voz do coração é nada mais que uma desculpazinha ética idiota para fazer idiotices. Aqui nesse mundo diferente não costumava a ter leis, pois homens racionais sabem agir de maneira idónea e correta sem a necessidade de um aparato opressor. Mas um homem chamado Rosseau provou que só se é livre quando somos governados pelas nossas próprias leis. Se estava provado e era racional, então os sábios começaram a fazer leis. Assim nós somos livres. Clara não era livre para amar.

Cada cidade se auto governava. Cada uma tinha a sua bandeira. Todas com formas geométricas, como definidas por Euclides. Clara gostava de rabiscar no seu caderno de física quântica. Vídeos aulas em 3D eram mais baratas e eficientes, pois amenizavam as probabilidades de um professor dar uma aula diferente da outra. Clara queria fazer poemas e queria beijar Antônio mas estava no meio de uma insólita e fria sala de aula projetada para 500 alunos. Ele era tão lindo. Mas ela era proibida de ter relacionamentos não-procriacionais. Existia uma fila de espera para poder ter um filho. Malthus provou que o boom populacional prejudicava a sociedade. Eram 3 da tarde, e Clara estava sentada na carteira fingindo ouvir o professor virtual. Ela estava maquinada, ela sentia, tinha sentimentos, e não se importava em saber porque. Nesse mundo depois da vacina pró racional, o homem deu mais um passo na escala evolutiva. O líquido amarelo era aplicado nas crianças logo ao nascer, fazendo com que os instintos diminuíssem em 92%. Foram preservados apenas os instintos indispensáveis. Isso não teve efeito em Clara pois ela ainda tinha o que vocês chamam de coração. No seu mundo; O centro das emoções. No nosso; Uma bomba de nutrientes e oxigênio para o corpo.

Clara tinha um plano para conquistar Antônio. Ela queria ele só para ela. Ela era egoísta.

Como narrador preciso dizer algo antes, para que vocês tenham uma visão ampla dos fatos: Suponho que os leitores devem estar, arrogantemente, julgando esse mundo-diferente de maneira errónea, pensando consigo- “que mundo infeliz”.- Pois saibam esse mundo é muito feliz, sim. A felicidade está no saber, e não na ignorância como muitos do seu mundo costumam dizer. Nós somos a antítese de todas as babaquices - macaquices- do planeta de vocês. Aqui não se tem sentimentos. Pelo menos não os grandes sentimentos. Temos apenas sensações contidas e equilibradas. Se o dia está nublada ou chuvoso, não é motivo para a nostalgia e para o mal humor. E não pensem que isso é ruim. Ruim é o modo seu modo de vida passional e isso é principalmente ruim para Clara que vive no nosso mundo mais é como se fosse do de vocês. Isso não é felicidade. Amar não é alegria , amar é sofrer como um babaca. E é esse sentimento, que vocês da terra julgam o mais nobre, que é o fruto de toda a desgraça de vocês. Mais uma coisa que é bom que seja explicada, Eu sou o Antônio. Eu fico observando essa menina irracional, ela disse que me ama mas eu nem sei o que ela quis dizer com isso.

Mas a vermelha da Clara tinha um plano para conquistar Antônio, e encher o mundo com a sua tolice de amor. Eu poderia contar para vocês o plano, mas sou incapaz disso pois não consigo entender o que rabiscos no caderno de física significam. Coisas como Corações e “bem-me-quer-mal-me-quer” e espalhar o pó de pirlimpimpim do amor em todas as pessoas e desenhos de sorrisos e um gatinho fofinho do tom e um poema sobre como o amor é bom. Isso era o que tinha no seu plano, era isso pois não tinha nenhuma causação lógica. Para mim seu plano eram rabiscos incoerentes e desprovidos de objetivo. Ela estava ansiosa para começar seu plano. Estava pronta para quando tocar o sinal do fim da aula e então começaria a espalhar o amor, começando por Tom. Ela sorria enquanto o professor falava sobre “quarks”. Sorria muito e estava feliz.

Um homem carrancudo e gordo se levanta da cadeira e vai de encontro a Clara- uma menina loira de 12 anos, com carinha angelical.-. O homem está vermelho de raiva e grita

-CORTA- Andando em direção a menina, que retribui com um olhar de medo e arrogância. No caminho ele tenta se controlar. Pensa em contar até 3 para diminuir sua Ira. “Ela é só uma criança, cuidado com o que falar. O executivo dele pode vir torrar seu saco depois” era o que ele pensava.

- Kate, você não pode sorrir assim, criatura! - Disse num tom entre o berro e grito.- Presta atenção! Você é uma menina que sente no meio de tantos insensíveis. Você nunca seria feliz. Ninguém te entende. E tem mais. Sentir nunca deixou ninguém mais feliz. Megasena deixa feliz.- Moderando a voz e tentando fazer com que a super-atriz-mirim entendesse.- Love will tear us apart. Capiche? - falou com sotaque hollywoodiano.- Vamos gravar de novo a cena, agora, sem sorriso. Certo princesa?- Com um sorriso irônico.

A atriz mirim fez cara de choro e o diretor se virou gesticulando para que o pessoal da produção fosse dar um jeito naquilo. Meia dezena de bajuladores correram para acalma-la e convence-la a refazer a cena da escola. Uma das ultimas cenas a serem filmadas. Habacuque Camparello, o diretor, ainda fazia o suspense total sobre o final do filme e a crítica já começava a criticar. Era de praxe. O que Clara faria para mudar o mundo racional? Esse era as capas das principais revistas de cinema. Que estão malconformadas com o fato de Habacuque não ter sequer escrito o roteiro dos últimos 20 minutos do longa metragem. O pessoal da imprensa cinematográfica achava aqui uma jogada de marketing barato.

Agora com a ultima cena gravada, todos estavam ansioso para saber como seria o final. O Granfinale. Habacuque dispensou todos e disse que o filme estava pronto, irritando bastante os infiltrados da industria da fofoca. Pego o rolo do filme, já editado, colocou em baixo do braço e saiu do estúdio de gravação sem responder a nenhum pergunta. O produtor ficou puto e sem poder fazer nada. O diretor tinha carta branca. Era o queridinho do chefão do estúdio. Não importa o que aquele cara fizesse venderia bastante, então deixavam que ele fizesse o que quisesse. Se quisesse.

Habacuque sabia como seria o final. “Não vou te contar o final, porque o final tem que vir do coração, senão esse texto não vai valer a pena”. Ele havia prometido para o irmão. Prometeu que contaria sua história, mas o irmão, Maleque, nunca lhe contará o final. Pois ele também nunca contaria o final que o público gostaria de ouvir. Habacuque olhava novamente o álbum de fotos, pensando em como seu irmão fazia falta. O maior erro que um morto pode cometer com os vivos é continuar vivo dentro dos corações. Maleque estava todos os dias com seu irmão. Maleque mudou a racionalidade do irmão, mudando toda a sua vida. Vivia da morte do irmão. A lágrima caiu molhando a foto antiga do irmão careca e pálido, vestindo um jaleco branco. Maleque estava na foto e na vida do diretor e faziam vinte anos já. Leucemia do irmão mais velho, seu ídolo pessoal. Eles brincando na gangorra. Seu irmão que movimentava o brinquedo, era maior e mais velho. Mais forte e mais inteligente.

Quando a leucemia chegou, sem avisar, nem mandar recado trouxe também o sentimentalismo, bobo, junto. Habacuque não gosta de chorar pelo passado, se sentia infantil. A maratona de hospitais acabou que juntou ainda mais os dois irmãos. Maleque animava Habacuque. Dizia que se fosse, estaria num lugar melhor. Mas o irmão mais novo odiava esses bobagens sobre morte. “Você não vai morrer, Irmão!”. Você não pode morrer, não suportaria sua falta, pensava. Dormiu muitas vezes no hospital esperando que no outro dia o médico dissesse. “Seu irmão está curado, é um milagre!”. Enquanto o milagre não vinha, seu irmão lhe contava muitas histórias, falando de como ficariam num filme. Explicava como a câmera passaria a emoção. Maleque era 10 anos mais velho e tinha acabado de terminar o curso de cinema. Era cheio de idéias, cheio de vida. Uma das histórias de era a história de Clara no País da Razão.

Maleque nunca contou o final da história. Dizia que se morresse gostaria de ver Habacuque fazendo esse filme. Mas não contava o final para o irmão porque o final só seria verdadeiro se viesse do coração de quem conta a história. E assim são as histórias mais belas, sejam aquelas que vem do coração do poeta apaixonado ou no lápis do romancista que olha o mundo como uma criança. Mas esse foi o pecado de Maleque, algemar o irmão ao passado.

Segurou o choro. Estava com um nó na garganta. Pegou o rolo do filme e esticou a película, juntando a ela uma outra. Na outra estava as cenas do filme caseiro. Eram os momentos dos dois irmão no hospital. Tiveram uma vida ali, por mais de um ano. Maleque sorria o tempo todo um sorriso amarelado e frágil. Era vulnerável, dando a impressão que se um vento o tocasse na sua pouca pele lhe quebraria os ossos. E assim enquanto o corpo se esvaziava da vida o sorriso mostrava a mais nua e crua alegria. Uma alegria incomodadora. E essa alegria seria o final do filme, pois era isso que estava no coração de Habacuque. Como o irmão pediu.

No vídeo caseiro o irmão contava a história de Clara e perguntava para Habacuque:
-Se eu morrer você me promete que contará a história de Clara?
-Não fala isso
-Promete?
-Seu eu prometer você para de falar essas bobagens? Então Prometo.

Era assim que Clara mudaria o mundo racional. Era assim o final do filme.

O diretor foi até o quintal da grandiosa casa, carregando uma caixa com coisas do irmão. Pegou um pá fez um buraco e guardou ali as lembranças do irmão. Terminado o pedido do irmão agora tentava também enterrar a sua presença. Habacuque pensava que amanhã levaria o filme ao produtor, e só então poderia viver SUA vida. Ele odiava cinema, porque o fazia lembrar. Pensou em que faria da vida. Deu um abraço no ar com um sorriso no rosto e disse.

-Adeus Maleque.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Craque da bola na bola Mundo.

Nasceu em um barraco, próximo ao córrego Nsa da Beleza. As paredes de maderite roxas resistiram a algumas inundações e incêndios. Seu pai pedreiro entendia bem sobre remendos em compensados de madeira. Sua mãe faxineira não deixava a casa ficar com o mesmo cheiro do córrego, e o chão mesmo que fosse de terra batida nunca estava sujo. Ele não chegou a conhecer a pobreza. Ou pelo menos não teve consciência dela. Vandeco nasceu com aquilo, coisa que só uma genética multicultural poderia dar. O samba do crioulo doido e o ziriguidum fizeram dos pé daquele menino obras de arte. Aos 5 anos de idade já chapelava. Aos seis estava jogando pelo time da rua e coloca a bola onde quisesse . Com nove anos era a estrela do campeonato nacional de futebol infantil. - Garoto prodígio, marca 5 na final – A família deu apoio. Valdecir deixava de trabalhar para levar o filho no treino. Tiveram sorte por conseguir um empresário honesto. Na verdade, o empresário teve mais sorte que eles. Estava ganhando uma nota preta com o pretinho do Vandeco. Nessa época todos já sabiam: O moleque ia estourar. Estourou. Contratado com o Real Madrid aos 13.

Vandeco continuou no Brasil emprestado ao Corinthians. Trampolim para a fama. Tinha mais entrevistas que treinos táticos. Comparações inevitáveis “será o novo Pelé?” .Vandeco humilde falava pouco. Deixavam que as pessoas falassem por ele. Também era assim com as mulheres. Namorou supermodelos. Não era um grande conquistador, mas seu talento conquistava. Tudo que ele falasse parecia interessante. Pessoas aplaudiam sua humildade, como também aplaudiriam se fosse arrogante e arrojado. Porque elas aplaudiam o seu Dom com a bola nos pés. O resto era conseqüência. Eram autógrafos, eram Gols.

Comprou casa de luxo para a família. Quando a imprensa o perguntava sobre isso respondia humilde : “Família em primeiro lugar”. Eles aplaudiam. Foi chamado para fazer comercias. Seu sorriso vendia milhões. Valia uma Cayenne.

Ele ainda era uma criança por dentro, mas já começava a entender o mundo. O mundo redondo, como a bola. Que ele não dominava com igual facilidade. Pessoas vinham atrás dele, queriam um pedaço dele. -Por favor, me vê uma picanha Vandeco!- Um frigorífico usou a imagem dele para vender mais. Ele ainda era uma criança, mas entedia que o mundo era redondo. Que as pessoas vinham atrás dele por interesse. O pessoal da Nsa da Beleza o ligava para convidar para churrascos, batizados e casamentos. Pura falsidade, o que eles queriam mesmo eram empregos. Queriam fama. Queriam estar perto do novo astro do futebol nacional.- Joguei bola com Vandeco- falavam orgulhosos. - Um dia dei um drible nele.- Orgulhosos.

*

Agora ele está ali. Penalty de final de libertadores. O estádio inteiro gritando VANDECO. A euforia era completa. Vandeco já sentira aquilo muitas vezes, e muitas vezes bateu penaltys e muitas vezes fez o gol decisivo. Era ele e sua melhor amiga. A bola. Gramado todo regular, e as luzes do estádio faziam o verde brilhar. Apesar de todo som da torcida, dentro da sua cabeça Vandeco mantinha um absoluto silêncio. Como só os craques conseguem. Correu para a bola, e no meio do caminho pensou em sua vida. Pensou na bola entrando no Gol, e pensou na gritaria. Chutou confiante, afinal ele era o craque.


A bola passou à metros do gol, e um silêncio infernal berrou em seu ouvido. Aquilo não podia estar acontecendo. Perdemos a libertadores. Por culpa do, até agora pouco, craque. Os xingamentos demoram o tempo necessário para que o público tirasse ele do patamar de craque para o patamar de estúpido. “Minha Vó faria esse gol” Gritou um gordo, redondo como uma bola. Foi tudo que Vandeco conseguiu ouvir. Foram apenas alguns segundos de silêncio. O garoto correu para os vestiários, empurrando a imprensa e chutando câmeras-man. Um fotógrafo conseguiu capturar as lágrimas do rosto do menino. A foto estaria no jornal de amanhã, com o subtítulo “ Craque?”.

Entrou na sua Cayenne e saiu o mais rápido do estádio. Mas não rápido o suficiente para que alguns torcedores conseguissem chutar o seu carro. Arranharam toda a lateral direita do carro importado, mas Vandeco não conseguia prestar atenção nisso. Dirigindo o carro sem saber para onde iria, a mente dele também não sabia quais as desculpas que ele deveria inventar para se auto compadecer. Fracasso era tudo que ele ouvia. Vandeco não sabia lidar com o desprezo, Vandeco não era um menino da favela. Ele nem sequer lembrava que era preto. O que ele não imaginava ainda era que amanhã ligariam para ele para cancelar contratos publicitários, que o pessoal do córrego da beleza ligaria para ele xingando. “filho-da-puta”.

E menino também não sabia que depois de amanhã tudo voltaria ao normal. Que todos esqueceriam daquilo. E ele voltaria a ser O Craque. Voltaria a fechar contratos e a ser convidado para ser padrinho de casamento. Agora tudo parecia estranho para a criança, mas ele era esperto e na próxima semana já teria entendido como a bola Mundo rolava. Rolava do amor ao ódio . E como a paixão poderia acabar facilmente como um apito de final de jogo. E como voltava igual um apito do início da partida. Vandeco só precisaria deixa a bola rolar.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Volta(s) no Quarteirao

acordo tarde _____duas e meia da tarde_____ com o sol batendo no meu rosto_____ preciso de um cigarro para aliviar o estresse_______acordar com o brilho amarelo _era pior do que minha mae me acordando______ seu vagabundo voce nao trabalha____nao___agora eu trabalho___ cade o cigarro caralho __acabou ontem anoite ______ainda estou meio lento__ preciso sair para comprar_____nao vou mudar de roupa _______seria uma tremenda hipocrisia colocar roupa de trabalho alguem ____que acorda duas e meia da tarde______ tinha sol mas estava frio _que frio _feche a janela _vou vestir um paleto marrom __por cima do pijama e vou comprar cigarro__ ah o ipod vou levar o ipod ___vou escutar uma musica boa para começar o dia_____ o dia ja começou faz tempo______deço pelo elevador olho no espelho___até que fiquei engraçado com o paleto por cima do pijama_____sou bonito__se nao sou pelo menos me acho bonito_______nao era um pijama nunca tivi pijamas era uma roupa qualquer que eu uso para dormir________bermudas de surfistas sao melhores para dormir que pijamas _______ uma banca de jornais proxima____________cigarro urgente__fica a duas quadras __________nao vou ouvir o ipod _______pensei que talvez visse o mundo diferente______nao consigo pensar em nada que não tenha tabaco________ um cigarro mentolado por favor__ tem isqueiro para emprestar___nao ___como nao_ vou ter que comprar um isqueiro___o cara disse que pessoas roubavam os isqueiros que ele emprestava___eu roubaria um isqueiro de uma banca porcaria igual a sua que nao tem isqueiros para emprestar___me ve um esqueiro tambem ___acendo o cigarro que isqueiro legal cricket por 1 e ciquenta barato__ gostei da banca___vamos dar uma volta no quarteirao__ eu e meu cigarro__ pisei em algo mole__ cocos de cachorros de madames teem cosistencias chique__ era umido e molenga na quantidade certa provavelmente era melhor alimentado que eu raçao cara balanceada com suprimentos alimentares bem diferente da minha dieta de cachorro quente___ as pessoas reparam em pessoas que usam paleto por cima de pijamas___uma mulher arrumando a vitrine de uma loja olha pra mim bonita parecia uma menina que conheci no ultimo final de semana___ a menina gostava de aranhas___ quem gosta de aranhas___ela era estranha_ gostei disso___ na rua passa um garoto de maos dadas com a mae dele___ele e a mae tinham a mesma altura___bonito isso __uma clinica de plastica para viados-eu pensei-um casal de bichas saiam do carro e entravam rapido na clinica um dos veados tinha algo escondido na bunda_um formato estranho_ era uma garrafa de cerveja com certeza___dei risada___o casal foi se divertir tentando inovar mas parece que nao deu muito certo___uma vez uma amiga me falou que muitas pessoas davam entrada no pronto socorro pedacos de cenouras quebradas dentro do reto_sera que esse medico teve que atender alguem no meio da madrugada_ serviço 24h para impalados_____nossa que vontade de fumar-coloque o cigarro na boca e de um forte trago_ahhhh_gosto de fazer onomatopeias dentro da minha cabeça_____um mendigo passa por mim ele levava um cobertor no ombro um cobertor bonito cheio de desenhos alguem doou para ele eu sera que ele roubou de alguem_como eu sou preconceituoso vou chamar o mendigo para tomar uma pinga vamos ao um bar ali perto e ele me conta a vida dele talvez isso desse um bom texto _qual seria o nome do texto_ no bar com um mendigo de cobertor e coraçao bonitos_ ele fedia achei melhor nao convidar_entao vou deixar cair uma nota de cinco reais do meu bolso_ o mendigo passa pela nota e nem ve_ que mendigo arrogante_ voltei e peguei a nota no chao na esquina da rua tem uma doceria_ la de dentro sai um gordinho__gordinhos fanaticos por docerias_esta comendo um bolo floresta negra__fiquei com fome quando chegar em casa faço um miojo para mim ou um cachorro quente_ se eu continuar assim vou ficar igual esse gordo_deveria comer algo mais nutritivo igual aquele coco de cachorro__ uma drogaria_drogasil lotada porra sao 3 horas da tarde e as pessoas lotam uma drogaria_isso era o mundo pos moderno tudo se toma drogas___esta com fome tome um remédio esta triste uma capsula esta alegre demais um comprimido esta na rua e virou mendigo cheire cola___ talvez devesse inventar um remédio para que aqueles bicha parasse de enfiar cenouras no cú___preconceito novamente__sera que seu eu tivesse ouvindo meu ipod eu estaria pensando em tudo isso___ me deu vontade de escutar Zombie dos cranberries_ fiquei pensando no pedaço da letra que eu conhecia__In your head in yooour heaaaad Zooommmbie zoonbie -nao sei o resto da letra traduzi o que isso significava- zombies na minha cabeça___ imagino como seria se tivesse um zombie na minha mente___ imagino que ele é que esta pensando em tudo isso eu sou apenas o corpo que ele/eu se apossou para poder dominar o mundo _piso em outro cocó -caralhoooooo- fico arrantado meu pé na calçada_muitas pessoas olhando para o cara de pijama que anda com um pé arrantando- me senti como aquele mendigo___ eu tambem me olharia se eu nao fosse eu___ gosto estranho na minha boca___ estou fumando o filtroooo preciso de outro cigarro ________fiquei muito irritado com o cocó e com a minha burrice___burrice nao___muitas pessoas destraidas ja fumaram filtros de cigarr0_________acendo outro_dilicia__ olho na minha mao o isqueiro Cricket por 1,50- uma pexinxa-passo de novo em frente aquela banca estou dando voltas no quarteirao engraçado-olha so tem uma cestinha de lixo escrito___coloque o coco do seu cachorro aqui___acho que ninguem nunca reparou nessa cesta___ pessoas que passeiam com cachorro normalmente usam ipod_ ninguem ve o mundo de fora quando se esta no mundo interno_da proxima vez que saisse de casa nao levaria o ipod_ mas quando chegasse em casa escutaria Zombie___uma casa toda branca com um jipe de exercito na garagem tem uma placa escrito em alemão no portão___na placa tem um desenho de um guincho levando um carro presuponho que seja algo do tipo -Se algum Herr filhadaputa estacionar na frente do meu portão eu mando guichar__O cara devia ser nazista; placa em alemão-jipe do exercito- e uma casa toda branca aludindo a raça ariana superior__um escroto de merda _como alguem pode se achar melhor que outro apenas pelas suas origens_não importa de onde partimos mas sim onde chegaremos_ daria um bom texto preciso lembrar dessa frase__quando chegar no meu flat vou escrever tudo isso que acontece_qual seria o nome do texto_o dia em que sai de casa sem meu ipod_Não ficaria muito coisa de escritor de massas de estilo comtemporanea que quer ganhar dinheiro fazendo o leitor se identificar com o texto__escritores que nao tem paixao por escrever_tive uma ideia -deve ser por causa desse cigarro mentolado- vou escrever um texto de tudo que pensei na volta pelo quarteirao vai chamar quarteirao e nao vou pontuar nem colocar acento_porque pensamentos nao sao pontuados nem teem acentos_olha que ideia genial___vai me render boas criticas_ poderia ganhar um premio por isso_ pena que eu nao escrevo pra ninguem_apenas meia duzia de frequentadores do meu blog vao ler__fodase isso é a verdadeira paixao por escrita_ vou ter algums problemas se nao colocar acentos -por exemplo o “é” como o leitor vai saber que é “é” e nao “e”_é vou acentuar apenas o “é” e ainda escrevo que eu pensei nisso pra deixar o texto mais interressante -nossa quase que um carro me atropela ____o cara tava saindo da garagem e eu ouvi o sensor de estacionamento do carro dele apitar___pipipi___ou seja cuidado motorista voce vai bater em alguem_ no caso eu_tem uma menina loira alta estilo modelo de mãos dadas com a mãe baixa mais também loira_ acho que vou convidar minha mãe para andar pelo bairro de mãos dadas__parecer ser legal___pena que eu não tenho mais mãe__na verdade eu tenho mãe mas talvez o texto ficasse mais emocionante se eu não tivesse___ porra eu to matando minha mãe por causa de um texto de merda___ para quem ja matou a gramatica matar a mae não é nada___ claro que é___ olho para tras para ver se a loira modelo esta me olhando _não esta__ parei numa outra banca de jornal_ uma banca de jornal muito bem organizada___a dona é uma tia gordinha___ela colocou todos as edicoes que fossem referentes a Italia juntas___revistas de aprenda a falar italiano viajem para italia receitas de pratos tipicos italianos achei isso bonito___as pessoas da rua estão reparando que eu estou dando voltas no quarteirao___ engraçado é que elas ja estao ficando com medo___posso ser um assaltante___São Paulo cria esse imaginario coletivo nas pessoas___ não vou fumar mais um cigarro vou para o flat e vou escrever esse texto cigarro mata__lei antifumo___ e da cancer __ deixa eu lembrar das coisas interessante que eu vi no quarteirao_ faça uma lista mental para nao esquecer___mendigo, nazista, banca, isqueiro, dois cocos, dois filhos de maos dadas com as respectivas maes___obvio que é com as respectivas maes eles nao poderiam trocar de maes___ afinal a loira modelo nem conhece o garoto da mesma altura da mae___ ou conhece___nossa isso esta ficando confuso esquece da lista_ senti um cheiro bom mas estranho e irritante_ vem do cabelo de uma mulher- cabelo brilhante- ela passou creme sem enxague___isso é nojento mas fica bonito pelo menos nela ficou___a parte estranha do cheiro é o cheiro de candida -cheiro de agua sanitaria- ela tinha maos secas por causa do produto___deve ser a faxineira de algum desses predios de luxo _quando voltar pra casa vou durmir mais um pouco acho que vou sonhar com zombies vou ter pesadelos com zombies na minha cabeça melhor eu nao durmir__vou escrever tudo e depois assisto um filme_ e ligo para o meu trabalho digo que estou com gripe_ essa vai colar- esta todo mundo com medo da gripe suina___ sera que é muito manjado essa desculpa_ bom deixa eu reler esse texto pra ver se eu nao esqueci de nada__ aaaaaa eu esqueci de deixar o meu sapato na area de serviço_ deixei um rastro de coco de cachorro por todo o flat_ caralho_ para de escrever essa merda e vai limpar__ em vez de colocar um ponto final no texto poem um ponto de exclamaçao por te lembra um cigarro que é o que voce vai fumar quando terminar de limpar a casa e seu sapato!___sera que tem um zombie dentro da minha cabeça?___que merda de blog spot ele tira os meus espaços multiplos_assim eu nunca serei um bom escritor___ vou subistiuir por %___ não vai ficar o texto mais irritante do mundo vou usar" _"___espaços eram melhores___mas !

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Comprimidos de Coragem.

-Cláu, você fechou a janela?
-Fechei, Bem.
-Sabe que São Paulo não é como antes!
-Sei, Selma, sei. Sabe o que eu sonhei esses dias? Com a nossa viagem a Paris. Aquela que fomos logo quando me aposentei.
-Cláu, aquilo foi o melhor presente que você já me deu. Eu não desconfiei de nadinha. Sabe que eu sempre fico falando de você quando vou no cabeleireiro. Não tem marido melhor no mundo!- disse Selma virando-se na cama para abraçar Claudionor.
-Que cidade linda! Aquilo sim foi nossa lua de mel! Nem perto de quando nos casamos. Saímos da igreja correndo para o sítio do seu tio Zé Carlos perto de Lins. Que casebre hein. Você lembra como foi?! Lembra quando aquela vaca entrou no quarto e lambeu minha bunda?
-Nossa eu morri de vergonha daquilo. Era minha primeira vez e uma vaca me entra no meio!

Riram, deram um beijo de boa noite e dormiram abraçados. Daqui a um mês completariam 40 anos de casados, e Claudionor já tinha comprado as 2 passagens, apenas de ida, para Paris. Faria como da primeira vez, uma surpresa, e tinha certeza que ela adoraria. Claudionor marcará para amanhã uma reunião, às escondidas de Selma, com um corretor para acertar a venda dessa velha casa. Com o dinheiro compraria um apartamento pequeno, só para os dois, e ainda sobraria uma boa reserva para gastar com Selma. Esbanjar na Cidade-Luz.

Era estranho para Claudionor pensar como seria a vida sem aquela casa. Viverá mais de 40 anos naquela mesma rua do bairro da Pompéia. Antes o local era pacato. Lembrava dos seus filhos brincando naquelas ladeiras. Cesinha jogava bola na rua. As ruas ficavam pintadas em tempos de copa. Vanessa tinha muitas amigas no bairro que vinham na sua casa para ouvir vitrola. LPs do Bon Jovi. A casa que seu Claudionor comprará por ajuda das empresas Matarazzo, onde trabalhava como supervisor do Mercado Superbon na rua Turiaçu, tinha muita história. No chão daquela sala, César venho ao mundo às pressas, seis meses e o menino resolveu nascer, pois nasceu. E assim era o seu filho que também resolveu ir morar nos EUA, pois foi. Hoje está bem lá, tem família, casou-se com uma americana feia, mas de bom coração. Seu Claudionor não se conformava, antes ficasse no Brasil e arranjasse uma mulata bonita. Selma o consolava “A menina é boa, e César está feliz. Isso é o que importa”. O velho concordava. E reclamava do Eduardo, o segundo marido de Vanessa que segundo Claudionor, era um vagabundo. O genro vivia de especulação em bolsa de valores e trabalhava em casa. Coisa de vagabundo. Mas Selma contornava o velho “Ela ama ele, e está feliz. Isso é o que importa!”. Claudionor concordava, sempre concordava com Selma, e retrucava “É... Que pelo menos esse não morra! Melhor um vagabundo vivo que um trabalhador defunto.” . O primeiro marido da filha morreu no segundo ano de casamento. A filha agora morava no Rio de Janeiro com Eduardo. Sem os filhos na casa, os Azevedo se sentiam sozinhos. A casa tinha eco. Seria melhor um apartamento pequeno, só para os dois. A idéia de mudar de casa ainda incomodava o velho Cláu.

-Então, aqui estão as chaves. Agora você é o proprietário. Meus parabéns!
-Hahaha, corta essas cordialidades Chico. Sabe que eu ainda estou me acostumando com a idéia.
-Oh, Caipira, vai para Paris, curte a dona Selma e aposto que vocês vão voltar de lá loucos para se mudarem. Mas não se esqueça, você tem 2 meses para desocupar a casa.
-É acho que Selma vai adorar voltar a Paris. Pena que não temos aquele fogo como da primeira vez.
-Que é isso Claudionor, agora as coisas estão mais fáceis. Uma pílula azul e pronto, você vira touro de novo.
-Cê acredita mesmo nisso Chico? Esses remédios são tudo farinha de trigo. É tudo enganação, quando cê chega na nossa idade não tem jeito mesmo. Só com guindaste.- disse rindo da própria condição, que não lhe agradava, mas sentia-se confortável em desabafar com um amigo de longa data que provavelmente passara também pela mesma odisséia masculina do fim da virilidade.

O amigo lhe deu uma cartela, e recomendou que testasse. Claudionor guardou no bolso achando aquilo uma tremenda bobagem. Despediu-se de Francisco, seu amigo desde os tempos que ele morava em Lins, interior paulista. O papo estava bom, mas não podia se atrasar senão a esposa desconfiaria dessa mudança de rotina. A rotina era sempre a mesma, qualquer atraso pareceria estranho. Era quarta-feira, dia de ir na pizzaria, iam a pé, ficava a 5 quadras da velha casa. Eram um simpático casal de mãos dadas andando pela rua. Seu Claudionor sempre vestido a rigor. Selma usava colar de pérolas. Há mais de 30 anos faziam isso. Pizza do Novaes – Quartas: Peça a pizza e ganhe um vinho! Eles trocavam o vinho pelo suco de laranja, Selma tomava remédios. Nas quintas eles jogavam tranca na casa dos amigos do Lions. Sexta era dia de fondue, Selma era de descendência suíça. Sábado iam ao Jockey Club. Todos horários regulados. Sempre juntos e de mãos dadas. Era a cumplicidade do amor da terceira idade, não importa o que aconteça eles estarão juntos. Mesmo que o prazer acabe.

Selma viajava uma ou duas vezes por mês ao Rio de Janeiro, com pretexto de visitar a filha que sempre foi muito apegada à mãe. Esses dias Claudionor dedicava aos amigos. Ia ao bar do Simão e encontrava a velha guarda dos demitidos da Matarazzo. Dessa vez, à algumas semanas da viagem a Paris, não seria diferente. A não ser pelos comprimidos. Claudionor preferiu testar antes de colocar em prática, pois pensou que se morresse do coração pelo menos não seria em cima de Selma. O que provavelmente a mataria do coração também.

A volta da virilidade. Sentiu se como se fosse jovem novamente, como se não necessitasse mais fazer concessões éticas e morais à Selma. Não se culparia mais por ser broxa. Já faziam mais de dez anos de inatividade, com alguns momentos de clarão, mas clarões que não eram lá de tanta claridade. Com a esposa fora por 5 dias, Seu Claudionor resolveu que teria tempo para viver novamente. Amava Selma, mas de outra maneira. Aliás, ele amava muito Selma, por isso tolerou aquilo por mais de 5 anos. Pensava que a culpa era dele. Pois agora seria mesmo. Os amigos do Simão iam para um forró. Cláu descobriu novamente como era. Florisberta, uma nortista arretada que tentava a vida em São Paulo, descobriu também o charme de ser uma princesa. Claudionor a tratava como um gentleman, faria de tudo para aquela que o trouxesse de volta. Flor, como ele a chamava, o trouxe. Comprou camisetas, tênis de corrida, entrou na academia e foi fazer natação. Ligou pra Selma e disse para que ficasse no Rio mais uns dias. Selma adorou, Selma adorava o Rio. Claudionor sabia por que. Ele concordava com a atitude dela. Ele sempre concordava com ela.


Selma o esperava em casa. Ela tinha chegado e ele não estava em casa, pois havia dormido com Flor. Claudionor ligou avisando, e pediu para que ela o esperasse. O velho entrou pela porta da frente passando pelo corredor cheio de fotos. Parou por um minuto na frente da foto do casamento. Ele sempre foi apaixonado por Selma, mas sem a virilidade ele se sentia coadjuvante na vida. Figurante do amor, fazendo pose para foto. Olhou outra foto deles, de 2 anos atrás. Viu seu sorriso fraco, e se sentiu mal por isso. Enxugou uma lágrima que insistiu em sair. Encheu o peito de ar e foi até a sala. Selma estava sentada, linda como sempre. Ela era 10 anos mais jovem que ele, uma tremenda cinqüentona, quase sessentona. Vestia um vestido vermelho colado. Sempre voltava do Rio com roupas insinuantes. Ela se levantou involuntariamente ao ver Claudionor vivo. Tinha olhos vivos. Foi como se se apaixonasse de novo. Ele foi na direção dela e a beijou antes que ela pudesse respirar. Selma sentiu o mundo dar voltas. Ele apertou a bunda dela, e sentiu seus pêlos arrepiarem.

-Selma, eu vendi a casa, e vou para Paris com Florisberta, minha namorada. O dinheiro da venda dividimos quando eu chegar de viagem. Volte para o Rio e passe bem com o Rogério.
-Você sabe do Rogério?

Claudionor ficou quieto. Não queria assinar o testamento de corno, nem dar esse sabor para Selma. Pois mesmo assim, mesmo tendo um namorado carioca- jogador de futevôlei- ela nunca abandonou Claudionor. Ela amava ele. Mas fazia amor com Rogério.
Era estranho para Claudionor pensar como seria a vida sem aquela Mulher. Mas era um estranho bom. Assim como o perfume de Selma.


Special thanks to Leo Ferraz pela cuidadosa revisão
Valeu pelo tempo despendido cara!

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Estranha Amizade.

Ficava no East Harlem NYC .Espremida entre dois edifícios, de mais ou menos 6 andares, estava o Il Fratelli. Uma singela pizzaria no Harlem italiano de toldo colorido: verde, branco e vermelho. Harlem que não era tão italiano assim, graças a invasão de latino-americanos em busca de qualquer forma de ganha-pão. Qualquer forma. A que aparecesse primeiro. Agora era Spanish Harlem, era um bairro revitalizado de manhattan, que algumas gangues ainda mantinham uma certa “ordem” na vizinhança. Se tiver dinheiro, os chicanos ilegais podem fazer você viajar até o Moon Harlem. Mas nada que saísse da “ordem” dos policiais. Toma-lá-dá-cá entre os bonzinhos e os malvados. Mezzo a mezzo.

Algumas poucas mesas cobertas de tolhas quadriculadas com as cores da bandeira nacional. Não a americana. Paredes de tijolinhos vermelhos, daqueles que querem parecer rústicos. Esse eram realmente rústicos. Um forno de pizza, grande para o tamanho do local, exalava um piu bello aroma de lenha, enchendo o ambiente de uma sensação de aconchego e nostalgia. Garrafas penduradas no teto. Fotos, não de famosos, nas paredes. Fotos do dono da pizzaria, fazendo pose com um copo de vinho na mão e um cogumelo verde na outra. O estabelecimento estava cheio como de costume, Il Fratelli di Luigi pizzeria era a atração da East 109th Street . A fila de espera ficava sentada no lado de fora em mesinhas de madeira, sob Guarda-sóis da Campari. Enquanto aguardavam um cobiçado lugar dentro, degustavam vinho e apreciavam umas porçãozinhas de cogumelos. Diversas variedades: vermelhos , verdes, brancos com bolas vermelho. Eram a specialitá da casa. A pizza de cogumelos - Pizza di Funghi ( Mushroom's pizza) : o nosso especial molho de tomates italianos preparado pelo próprio Luigi, coberta com uma excelente combinação de cogumelos raros, que com certeza te darão 1UP.- era a mais vendida. Mas, sinceramente, não tinha nada de especial na pizza. Uma pizza simples com recheio de mexidão de fungos borrachudos. Vero, o repente sucesso do restaurante não era devido a qualidade da comida. O chamariz era o próprio dono. Seu Luigi.

O proprietário era um senhor de roupa verde, estranhíssima, alto e magro. Tinha um rosto ossudo, guarnecido de um gordo nariz redondo. Antes tivesse um grande bigode para disfarçar tamanho do nariz. Pois tinha. Um grosso bigode, que hoje , diferente das fotos da parede, estavam grisalhos e mostravam os sinais da idade. Tinha 48 anos. Usava o mesmo quepe, também verde, que à vinte anos. Anos que estrelou numa série de TV e de jogos de vídeo-game interpretando o personagem homônimo. Luigi abriu a pizzaria logo que se casou e saiu do showbiz – estava cansado da fama e procurando constituir uma família-. A série durou mais 5 anos sem ele, ficou obsoleta e cafona. Isso fazia tempo, a empresa faliu e os jogos em 2D não estavam mais nos planos das mega-indústrias do entretenimento. Isso não fazia muito tempo, foi a apenas a 2 anos que a moda Retro voltou, as crianças que jogaram os jogos na infância, hoje levam os filhos pra comer a pizza do Luigi, e lotavam o lugar. Ele nunca esperava que “Isso” fosse acontecer. Pagavam pela nostalgia. Isso era o rentável negócio, pizzas de segunda não davam dinheiro. Non que Luigi gostasse muito “d`Isso”. Passava em todas as mesa para repetir “Mama Mia” ou “Mário, where are you?”. As criancinhas apertavam seu nariz. E ele tinha que, todo dia, lembrar do passado, quando perguntavam por Mário. Catso! Era o jeito dele pagar as dívidas que fez nos outros 18 anos de total estagnação da Il Fratelli. Ele vivia do passado, que já tinha passado, ele vivi n`Isso. Infelizmente. Ou felizmente.


-Seu Luigi, a Mesa 5 quer que o senhor vá lá - disse um dos garçons, que nada tinham de italianos. Imigrantes ilegais porto-riquenhos. Contratava esses sujeitos mal encarados que ainda arranhavam o inglês, não por pagar menos impostos. Era bom fazer amigos na comunidade.

“Caspita” pensou Luigi, enquanto ia até a mesa. Torcendo pra que não tivesse nenhum criança idiota que gostasse de narizes gordos e redondos. Grazie Dio. Era um apenas um homem solitário. Provavelmente um Gamer nerd, pensou. Foi se aproximando da mesa que ficava do lado de fora, analisando o espaço ao redor em que faria o showzinho improvisado. Um homem, baixo e gordo, segurando um copo de bloody mary. Reconheceria aquele rosto em qualquer lugar. Mesmo não tendo mais o bigode, mesmo não usando aquele, porco, macacão jeans. Mesmo sem aquela empolgação eufórica de antes. Era ele. Seu grande amigo. Quantos anos desda ultima vezes? 3 anos? Apesar de sentir saudades de Mário, sua presença de certa forma o incomodava. Coisa boa não era. Dinheiro ou fofoca do mundinho dos decadentes da fama. Ou era favores. As últimas duas vezes que o viu foram pra pedir empréstimos, que nunca foram pagos, e nem seriam. Luigi não ligava pra dinheiro mesmo. Mário nunca aceitou o fim do show, tentou usar os contatos para deslanchar a carreira como ator, mas ninguém o via além de Mário, o personagem. Além de um estranho imigrante italiano pobre e sem talento. Luigi entendia isso. Estava feliz por vê-lo mesmo assim.

-Amici! Não vai fazer a apresentação?!- Mário disse tentando tirar um sorriso alegre do próprio rosto. Saiu um sorriso, mas alegria não se pode falsiar. Pelo menos não pra alguem que lhe conhecia tanto como Luigi.

Parlavam na mesinha sob o guarda-sol. Ninguém venho incomodar, ninguém o reconheceria assim. Acabado, assim. Mário bebia compulsivamente Blood mary e comia porções de peperoni.- Odiava cogumelos-. Luigi já não se divertia tanto com o amigo, mas o ouvia. Ele era puro passado, falava do passado vivia no passado. Mário contou como estavam os outros. Contou que o garoto que vestia a fantasia do Bowser no programa agora tinha virado dono de uma botique L.A. Estava ganhando um dinheirão. Elogiou o sucesso de Luigi na pizzaria, nunca esteve tão cheia. Falou sobre a vida de todo mundo que conheciam. Bernard, um anão queniano que fazia Toad, o cogumelo falante, agora apresentava um noticiário para anões na TV a cabo. Mário só não falou sobre si. Não tinha o que falar. Luigi já sabia ele estava quebrado e morava num trailer herdado do tio. Mário gastou tudo na bebida, gastou com mulheres. Mario ostentou a fama muito depois dela ter acabado. Como qualquer rebento da escuridão da pobreza, que ofusca os olhos ao ver os diamantes brilhantes do luxo, ficou muito tempo iludido. Luigi gostava de Mário mesmo assim. Era duro ver um amigo nessa situação. Mas Luigi sabia que aquilo tudo, todo esse falatório, era teatro. Mario só viria a pizzaria se tivesse algo realmente importante para falar. Ele não gostava de ver Luigi, dava saudade do tempos áureos. Não gosta de ver a esposa de Luigi.

-Mário! Que surpresa!- Disse uma senhora loira. Trazia mais uma entrada de peperoni. Telma, esposa de Luigi, ainda mantinha um ar de princesa. Não que fosse delicada como no seriado. Telma era um mulher muito resolvida fora de cena. Não era uma atriz de primeira, mas sabia disso e não ficava ostentando intelectualidade, nem querendo se fazer passar pelo que não era. Era prima do diretor e por isso pegou o papel. Ela era tudo que Princesa Peach não era. Sensual e intrigante e nada ingênua. Coisas que fizeram muitos homens se apaixonar por ela. Mário inclusive. Mas ele teve outros planos quanto as mulheres. Amor não combinava com seu estilo de vida. Casou com Luigi pouco antes do programa acabar.

-Que Bela! Mas você cada dia mais Linda. Parece que os anos não passaram pra você. Fique aqui, sente-se per parlare um pouco!

-Obrigado Mário, mas eu preciso cuidar do forno. Esses hispânicos são péssimos como pizzaiolos.- disse baixinho, com medo da vizinhança.

Continuaram o papo nostálgico. Lembraram de quando entraram no camarim do Bernard. Escreveram um monte de piadinhas de anões de parede. O queniano quase pediu demissão, o cara tinha pavio mais curto que as pernas. Não tolerava nenhuma brincadeira quanto a altura, raça ou sua preferencia sexual. “Também anão, viado e preto. Imagina o que o cara já teve de escutar” disse Luigi. Riram da lembrando do chilique que o baixinho deu. “Tenho traços de nanismo, Não sou anão” esbravejava quando provocado. Por causa da brincadeira o produtor deu lhes uma advertência e não receberam 2 meses de salário. Valeu a pena, concluiu Mário. No meio das lembranças Luigi reparava que sobre aqueles olheiras de Mário seu olhos corriam solto procurando olhar pra Telma sem que Luigi percebesse. Luigi não fez nada, nem poderia. Por fim, Luigi já incomodado com tanto papo furado.

- Mas me diga Mário o que te trás aqui?
- Olha, vou te contar algo. Muito importante. E você não vai gostar
- Ma que catso! Andiamo para com esse suspense Parle!- Luigi disse ficando irritado.

Mário balançou a cabeça apontando a porta, sinalizando pra que eles fossem conversar lá fora. Luigi concordou. Eles andaram pelo Harlem Espanhol. Luigi estava ansioso para saber o que Mário tinha para lhe falar, mas ficou quieto esperando que Mário começasse a desembuchar. Mário adorava enrolar a conversa, fazia o suspense para comover Luigi. Andando pelo bairro com Mário, Luigi se perdia entre seus pensamentos. Olhava a revitalização. Nem parecia o bairro que eles moraram quando chegaram da Itália. Foi perto dali que eles se conheceram. Os dois estava duros e precisavam conseguir um emprego. Foram contratados por uma agência de serviços. Faziam de tudo e normalmente colocavam os dois para trabalhar juntos. Instalação elétrica, reparos em assoalhos, chuveiros, faziam bicos como encanadores também. Foi nessas indas e vinda que eles ficaram grandes amigos. Ele nem ele nem Mário falavam inglês fluente ainda. Durante o trabalho chacotavam entre si, sobre o cliente, em italiano. Xingavam em italiano. Mário fazia caretas para Luigi imitando os clientes. Numa dessas casas, onde foram chamados para desentupir uma privada de um senhor gordo, muito gordo- um porco de terno- que era produtor, foi que a Fama começou. Produtor teve um insight e disse que eles virariam popstars. Naquela época eles acharam mais divertido o tanto de bosta que aquele porco cagava, do que a possibilidade de serem famosos. Fred, o gordo produtor, estava com um projeto de jogo de vídeo-game e procurava um personagem que o inspirasse. Mário e Luigi, era exatamente o que ele procurava, dois encanadores italianos bobos. Daí pra frente tudo mudou. Luigi não tinha certeza se mudará para melhor ou para pior.

Viraram a esquina da Pleasant Av.. Mário estava impaciente. Luigi ficou impaciente de ver Mario impaciente.

-Luigi, Eles voltaram. Eu pedi um favor para Eles e agora Eles nos querem trabalhando de novo.
-Como assim Eles. Você, não está falando DELES? Está? - Disse Luigi já ficando vermelho de raiva e medo.
-É, dos Bonanno.

Luigi ficou branco. Teve uma sensação de ter parado o coração. Eles voltaram, tudo voltaria. O fantasma do passado, tudo que ele tinha trabalhado pra esquecer. Anos de terapia para poder conviver com isso. Porque Mário foi falar com eles. Mário era um idiota. Ele não devia ter feito isso.
- Você é um IDIOTA- Disse enquanto seu punho fechado ia de encontro ao olho de Mário. Luigi não consegui controlar sua mão. Mário, que já estava bêbado, cambaleou e caiu desmaiado na calçada. Também não conseguiu controlar a força.

Luigi abriu um antigo baú no porão da pizzaria. Estava tudo ali do mesmo jeito que ele a 20 anos havia deixado. Os Bonanno. Fotos e recortes de jornal da época. Era como Boo. Um fantasma do passado. Fantasma que já havia sido exorcizado. Luigi tremia e falava sozinho pornográfias em italiano. Os Bonnanos eram uma das fámilias que controlavam o crime organizado em Nova York. E mesmo depois do arrocho polícial pra cima da Máfia, ela ainda continuava operando no submundo. Mais fraca que antes, mas não menos tenebrosa. Ao menos para Luigi que um passado de “amizade” com os compatriotas. Pegou aqueles papéis e foi até o Jefferson Park.

Sentado na próximo ao campo de futebol do parque, Luigi podia ver as crianças hispânicas jogando bola. Assim como ele fizera muitas vezes. Futebol no país da bola oval não era bem visto, ele sempre foi um estranho ali. Como aqueles garotos de Porto-Rico. Os excluídos criam as suas próprias inclusões, um italiano em Nova York não era ninguém se não tivesse no grupo dos italianos. A máfia era a maneira dele conseguir sobreviver. Quantas vezes passou fome na metropóle mais rica do mundo, e os únicos que o ajudaram eram os criminosos. Ele não era criminoso, repetia pra sí próprio tentando se convencer do contrário do que aquelas fotos na sua mão diziam. Foi a uma quadra dali, num daqueles condos. Ele podia ver o quarto andar daquele prédio. Ele podia ver a janela. Podia ouvir o som do tiro. A notícia do jornal dizia “Morto à tiros ator ativista contra o crime.” Não foi culpa dele, foi culpa do Mário. Sentiu se mal. Mário nem sequer sabia de toda essa porcaria. Quando chegou em NY, Luigi assim como Mário, assim como a maioria dos imigrantes, fez “amizades” de influência. Chego a beijar o rosto do Carmine Galante. O “Lilo”. Eles te fazem favores, eles lutam juntos pela sobrevivência dos italianos. Mas eles também pedem “favores”. Luigi nunca chegou a dever favores para eles, sabia o que acabaria acontecendo. Mário pedia favores antes da fama. Durante a fama. E depois da fama. Os Bonanno não cobraram os favores de Mário, por que aquele Idiota acabaria fazendo besteira. Cobraram de Luigi, o pessoal do crime são como cães, eles farejam medo. Eles sabiam que Luigi não arriscaria a vida do seu melhor amigo. Ameaçaram matar Mário, por uma dívida de jogo que o Idiota fez e não podia pagar. Mandaram Luigi apagar um cara, lhe deram a arma, e o local. Ele era perfeito para o crime. Ninguém desconfiaria dele. Encanador, trabalhador e bom amigo. Bom demais para não matar pela amizade. Foram dois tiros na testa. O cara estava no quarto com a esposa. Luigi nunca esqueceu o choro de desespero da mulher. Agora Mário estava deitado no sofá de seu apartamento sendo cuidado por Telma que colocava um gelo sobre o seu olho roxo. Idiota. Olhou mais uma vez o jornal amarrotado : “o ator de 30 anos foi morto com dois tiros na testa na frente de sua esposa. O assassino não foi identificado.”

Luigi enxugava as lágrimas enquanto abria lentamente a porta do seu apartamento. Não chegou a entrar. Pela fresta, entre a porta semi-aberta e o batente, viu Mário. Sentado no sofá ao lado de Telma. Com a mão na perna dela. Aquela mão imunda. Ela tinha um sorrisinho no rosto. Ela falou algo para Mário. Luigi não conseguiu ouvir, mais pode ler os lábios da esposa. “Ainda sinto aquilo por você, sonho com você todos os dias.” Luigi sabia que Mário e Telma tiveram algo. Fazia tanto tempo. Achava que aquilo era passado, mas o passado voltava como um fantasma. Estava com um nó na garganta. Fechou a porta, não conseguia mais olhar aquilo. Mário ainda era seu amigo. Luigi não conseguia acreditar como Mário ainda podia ser seu amigo. Mas era. Telma só estava com ele porque dava a segurança que Mário não podia dar. Luigi estava sem chão. Luigi nunca se permitiu viver uma mentira, ele no fundo sabia que Telma sempre foi apaixonada pelo amigo. Amizade tem limites? Luigi achou melhor ele fujir. O passado dele acabava aqui. Ele era um estranho nessa terra. Ele sabia que podia contar com Mário para tudo, mas nunca precisou dele. Mário precisava de um amigo verdadeiro, Luigi era um amigo verdadeiro.

Luigi caminhou novamente até o Il Fratelli. Fratelli é a amizade, pensou. Telma e Mário se amavam, não podia, um amigo verdadeiro, impedir. Lembrou se do porque da amizade, enquanto todos o faziam ser um estranho, Mário o fazia parecer corajoso. Mário defendeu Luigi algumas vezes, o defendeu da solidão da metrópole. E agora ele estava sozinho novamente. Foi ao porão da pizzaria, pegou o baú e foi até a rua. Chamou um taxi. Colocou o baú no porta malas. Pediu 1 minuto ao estranho taxista indiano. Deixou aquele jornal cair propositalmente de sua mão no meio do salão do Il Fratelli. Mário talvez entendesse. Talvez não entendesse. Talvez fosse melhor que ele não entendesse mesmo.

- Taxista me leve para qualquer lugar longe do passado.
- What?- disso o homem num inglês indianizado estranhíssimo.