“Tenho-me esforçado por não rir das ações humanas, por não deplorá-las nem odiá-las, mas por compreendê-las.”
Bento de Espinosa. Filosofo

"rapadura é doce mas, no entanto, não é soft and crispy"

Francisco Bruza Espinosa , Desbravador da Bahia
"Olá Leitores, Muitissimo Boa Noite, Tarde ou Manhã. Vamos dar inicio a nosso teatro de palavras, Motivados pelo nada e patrocinados pelo tudo, inclusive por sua Tia."

Tenham um bom voo

Lucas Et Cetera Proa


Magalomania é um transtorno psicológico no qual o doente tem ilusões de ser Sidney Magal, em carne e osso!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Cláu, o palhaço.

Ele sabia.

Foi o que viu nos olhos do garoto..

Foi o que viu no sorriso do palhaço.


-Na frente vai o dono, um russo mal humorado. Depois o picadeiro desmontado, kilos de lona colorida. dai vem os animais, vem a mulher barbada, vem o carro dos anões. E os malabarista vem em um vagão exclusivo. O que não significa muito luxo, 15 polonêses dormem ali. Expremer talvez fosse a expressão correta. E nesse vagão final ficamos eu e o mágico. Dividimos esse vagão dormitório. O que já deu muita confusão. Quantas vezes acordei com um coelho em cima de mim. E as Pombas que adoram durmir dentro dos meus sapatos. -


Ali estava o palhaço Cláu. o Famoso palhaço do circo Dudinka. Sentado na penteadeira do camarim retirando a maquiagem, branca e vermelha, com um pano úmido, molhando o na cumbuca com água e passando sobre o rosto. Então passava de volta na água, turvando-a de cor-de-rosa. No cabideiro estava pendurado a peruca e o colarinho largo. Seu cabelo estava duro e oleoso, como só um artista de massas consegue ficar. Um garoto de uns 14 anos estava atrás dele sentado numa banqueta, olhando com olhos de milagre para seu ídolo. Ouvindo atentamente as histórias do palhaço. O garoto saiu correndo para o camarim logo que o espetáculo terminou.


O garoto estava louco para ver o palhaço. O palhaço estava com saudades do garoto.


Todo ano que o circo passava por ali, ali estaria o garoto.

Teve um ano que o circo não apareceu. E o garoto fez a mãe lhe levar a capital só para ver o palhaço.


-A vida no circo não é engraçada. Aqui parece que está todo mundo rindo. O mundo ri. A lua é sorridente. Em noites de calor os bichinhos de luz ao redor da lâmpada parecem estonteantes de felicidade. O palhaço tem que fazer todos rirem. Mas quando todo mundo ri parece que o sorriso é sempre igual. Um sorriso cinza de obrigação, ele é forçado. A vida te força a viver. E pra viver eu forço o sorriso. O riso não deve vir empacotado, o riso é espontâneo. O verdadeiro riso acontece nas vidas das pessoas, não no circo. Mas muitas pessoas desaprenderam a rir.


Garoto, você é meu fã número 1,sabia?!


Alegria vem, alegria vai. O palhaço vê pelo espelho o garoto. Olhava os traços do rosto e sentia saudades dos dias que ele não estava por perto. Talvez pensasse em como seria a vida se não fosse assim. Jogado pelo mundo, o palhaço encontrava uma nova vida em cada cidade. Mas essa cidade era especial. Por isso mesmo ele nem gostava de ir ali.


Um amor jogado no meio dessa vida de risadas. O amor passa pelas vidas. Há de passar. Pois passou para o palhaço. Passou. Foram as poucas semanas que ficou naquela cidade à uns 15 anos atrás. Um pequeno conto no meio de um romance de estrada.


Quer um nariz de palhaço? Pode ficar! - disse se virando para o garoto.


-Você é meu filho. Desculpa por não ter te visto crescer. - O palhaço pensou em falar isso.


E não falou.


As vezes, mas só as vezes ele para pra pensar como seria se não assim. Nessas horas ele ri para não chorar. Mentira. Ele chora. Mas só as vezes. A vida sem compromissos, sem rumos, sem seguranças, sem lar, é boa. Muito boa alias, nunca se tem rotina, nem chatices da vida. Só não é boa quando você para pra pensar.


Uma garota linda o olhava da platéia, e ele ainda tinha o sorriso da alegria. Durante todo o espetáculo ela não tirou os olhos dele. Ele fazia cambalhotas, e tacava tortas, pomposo, pois sabia que aquela garota estava olhando só para ele. Ele olhava as vezes para platéia, mas só olhava para ela. Não vou dizer que isso nunca lhe havia acontecido, as pessoas do palco sente sempre isso, essa troca de olhares e de sensações. Mas sempre é novo e incrível. É Incrível como todas as outras pessoas desaparecem nesse momento. E o show vira uma apresentação para uma só espectadora. Quando ele chegou ao camarim lá já estava ela.


- Você foi mais rápida que eu. Estava com saudades né?


Ela só o olhou com aquele olhar de adolescente e o puxou pelo braço. O palhaço resistiu ao puxão, porque queria ser puxado. - Aprenda isso, só é puxado aquele que tenta ficar parado- O mundo é muito mais simples nessas horas. Eram os dois ali, o palhaço e a garota da cidade do interior, vivendo suas paixões irreais. As paixões irreais são muito mais importantes na vida de uma mulher que as reais.


Deve ser porque depois que tudo acaba, elas podem se perguntar:


Como seria se não fosse assim?


Naquela noite as risadas não podiam ser contidas, por isso pareciam gargalhadas. Sabe, a paixão é como uma gargalhada, pois é o amor em sua forma incontrolável. Naquela semana ela venho em todas os as apresentações. E foi ao camarim depois de todas elas.


E ele nunca se sentiu tão engraçado, nas graças daquela garota suas falas eram piadas e seus risos eram suspiros. Se engraçavam por toda a noite, e a luz do sol o acordava na cama suada do seu camarim e ela já não estava ali. E durante toda a tarde ele esperava que chegasse a noite. Esperava que o show começasse, pois ali no show o amor também começava.


Mas a vida se reinventa e o palhaço se foi com a comitiva. E teve outros amores. E viveu outras histórias. E a garota que ficou, ficou com saudades mas nem sequer sabia onde o palhaço foi. E foram um mês... e dois. E foram três meses. E a barriga venho. E nas cidades de interior mãe solteira é vagabunda, então se casou com o garoto que era apaixonado por ela.


-Eu estava na maternidade quando você nasceu. Sua mãe me mandou uma carta, eu fingi nunca ter recebido. A gente escolhe um jeito de viver. E queria viver esse amor, mas a comitiva segue e a gente tem que ir.- O palhaço queria se explicar ao garoto, mas achou melhor não.


Ele recebeu a carta que ela falava sobre amor e sobre família. O palhaço pegou um ônibus pra ver seu filho nascer, e chegando na cidadezinha do interior viu uma placa dizendo:


Bem-Vindo a BELO RISO.


Quando chegou no hospital olhou para todos aqueles bebés na maternidade. Sentiu o medo, o verdadeiro medo que é aquele que só quando se quer amar se sente. O medo de amar. - Entenda que no fundo todos os medos vem do amor.- E ele resolveu ir embora, porque só assim o garoto teria um pai de verdade. Um pai presente e não um palhaço qualquer. E pegou o ônibus de volta, e saindo da cidadezinha viu pela janela uma placa pichada que dizia:


Volte sempre com seu AMARELO RISO.


- No circo, garoto, todos torcem contra os equilibristas. As pessoas querem o pior, isso faz elas se sentirem melhores.-


O palhaço Cláu sabia que aquele não era seu filho, e por isso não falou nada. Mas sempre que estava de volta a RISO ele gostava de imaginar como estaria o seu garoto. No fundo ele esperava que o garoto nunca descobrisse que era filho de um palhaço, pois só assim o riso do menino poderia ser verdadeiro. Pois a verdade esta no amor, assim como o sorriso. É por isso que o palhaço sorria sem verdade.


Era tarde e o garoto foi embora.

E quando saia estava usando o nariz do palhaço.

E sorriu com verdade.

Então ele viu que o garoto sabia.


Então o palhaço pensou. Como seria?

1 comentários:

Anônimo disse...

Uau! Pra mim, até hj, este é o melhor! Um texto mais maduro, bem estruturado, além de tocar, fazer pensar pelo viés da sensibilidade, com um quê de reflexão "submersa" na emoção/nos reveses dos relacionamentos que se interpõem ao longo da vida.

P.S.: mas ainda é preciso pegar um pouco no pé

Postar um comentário